História de Peniche e imagem de 1860 do antigo brasão
A VILA E PRAÇA DE PENICHE
Na costa da provincia da Estremadura, doze léguas ao noroeste de Lisboa, está edificada a vila e praça de guerra de Peniche. Ergue-se sobre rochas, na extremidade de uma pequena península que o oceano, no preamar das águas vivas, quase reduz ás condições de ilha. E parece fora de duvida, que era uma ilha há mil e novecentos anos e que nela se abrigaram os herminios, fugindo da serra da Estrela, onde habitavam, acossados pelas armas triunfantes de Júlio César.
Mantiveram-se firmes por um mês naquele inóspito lugar, que o mar e os rochedos defendiam. Mas afinal, apertados da fome, tiveram de render-se ao inimigo; Júlio César, contentando-se de sujeitar ao domínio de Roma os indomitos lusitanos, foi clemente e benigno com os vencidos. Segundo alguns autores, ficando na ilha todos, ou a maior parte dos herminios, aí deram principio á povoação que ao diante, vindo a unir-se a ilha ao continente por uma restinga de areia, se chamou Península, do que se derivou por corrupção o nome de Peniche.
Porém, conforme a opinião de outros escritores, os herminios voltaram para os seus antigos lares e a origem de Peniche é coeva com a fundação da monarquia ou pouco anterior. Seguindo o parecer destes, os primeiros povoadores de Peniche foram, ainda antes da vinda do conde D. Henrique a Portugal, os moradores da vizinha vila de Atouguia da Baleia que, atraídos da comodidade que o sitio oferecia para a pesca, aí começaram a construir cabanas.
D. Afonso Henriques foi auxiliado na conquista de Lisboa, como é sabido, por uma armada de cruzados que, nessa ocasião demandara o Tejo. Nas doações que fez de diversas terras, em recompensa daquele serviço, aos cruzados que quisessem ficar no país, coube aos irmãos D. Roberto e D. Guilherme Lacorne o território da Atouguia da Baleia e de Peniche. A estes estrangeiros deveram, pois, aquelas duas terras, senão a sua fundação, pelo menos um grande impulso na sua povoação e edificação.
Até ao fim do século XV a pesca era o emprego exclusivo dos seus moradores e emprego mui lucrativo, pela abundância e infinita variedade de peixes que frequentam aquela costa. Porém quando D. Vasco da Gama e Pedro Álvares Cabral, devassando novos mares, franquearam a Portugal as portas da Índia e do Brasil, aqueles ousados pescadores, pondo a mira em mais elevados lucros, armaram navios de alto mar e lá foram enriquecer-se e mais á sua terra natal no comercio desses novos e riquíssimos países.
Por este modo viu o século XVI engrandecer-se Peniche, até contar mais de mil fogos e de cinco mil habitantes. As humildes cabanas dos pescadores foram-se transformando em boas moradas de casas e as acanhadas ermidas em templos mais grandiosos.
Em 1609, D. Filipe III de Espanha, que então governava em Portugal, deferindo á suplica dos moradores e donatários de Peniche, que era o conde de Atouguia, D. João Gonçalves de Ataide, elevou esta povoação à categoria de vila.
El rei D. João III, que foi o primeiro dos nossos soberanos que principiou a fortificar a barra de Lisboa, foi também o primeiro que, reconhecendo a importância de Peniche para a defensa marítima do reino, aí mandou construir um reduto. E tal é a fortaleza natural desta posição que, ajudada apenas deste reduto, resistiu ao exercito inglês que ali desembarcou em 22 de Maio de 1589, para fazer valer a pretensão de D. António, prior do Crato, ao trono usurpado por Filipe II de Castela.
Logo depois da expulsão dos espanhóis e da aclamação de D. João IV, determinou este monarca fazer de Peniche uma praça de guerra. As novas obras de fortificação foram dirigidas pelo conde de de Atouguia, D. Jerónimo de Ataide. Estas foram ainda acrescentadas e melhoradas em 1809 e 1810, por ocasião da defensa do reino contra as invasões francesas.
Em 1671 mandou el rei D. Pedro II executar alguns trabalhos, com que se melhorou o porto Peniche.
El rei D. João V e D. João VI, sendo regente, honraram esta vila com a sua visita. O segundo aí passou oito dias, em 1806. Residiu no palácio dos governadores da praça.
As diversas causas que produziram a decadência do nosso comercio, actuando do mesmo modo sobre a vila de Peniche, foram empobrecendo a terra e reduzindo-a outra vez aos recursos da pesca e aos limitados produtos da sua industria agrícola e manufactora, reduziram também os seus moradores ao numero de três mil e trezentos, que ao presente encerra.
A vila está assentada parte em lugar plano, parte em terreno um pouco elevado. Tanto as ruas como as casas têm uma certa regularidade.
Dividem-se os moradores por três paroquias que se intitulam: Nossa Senhora da Ajuda, Nossa Senhora da Conceição e S. Pedro. Este ultimo templo é o maior e melhor. Duas fileiras de colunas de ordem toscana dividem a igreja em três naves. A igreja da Misericordia é notável pelo seu magnifico tecto, onde se vêem cinquenta e cinco quadros pintados a óleo em pano e representando os principais sucessos do Novo Testamento. A maior parte destes quadros são obra de Josefa de Ayala, aquela insigne pintora que tanta celebridade adquiriu sob o nome popular de Josefa de Óbidos, sua pátria.
Além da casa e hospital da Misericórdia há outro estabelecimento pio, criado em 1505 pelos marítimos, que o administram. É destinado a socorrer as viúvas e filhas destes. Intitula- se Casa ou capela do Corpo Santo.
Os outros templos da vila são: a bonita capela de Santa Barbara, que é o orago
Peniche é praça de guerra de primeira ordem e como tal tem guarnição de artilheiros e um destacamento de infantaria e costuma ser governada por um general. As fortificações, além da muralha que cerca toda a vila, compõem-se de seis baluartes, o forte da Luz, na extremidade do norte que domina o mar e o istmo e a cidadela, que se ergue na extremidade do sul, dominando também o porto, a esplanada e a própria praça. Na costa vizinha há de um e outro lado pontos fortificados. Na cidadela está o palácio do governador, quartéis, etc.
Esta pequena península forma duas enseadas, a do norte com pouco fundo e a do sul com suficiente profundidade para surgidouro de navios de pouca lotação, que aí acham abrigo contra as nortadas. Duas léguas para oeste do cabo de Peniche, estão as ilhas Berlengas.
Os subúrbios de Peniche são áridos, como é toda a costa da Estremadura. O istmo, que liga a península ao continente, é uma extensa praia de quatrocentas braças de norte a sul. O terreno da península, junto á vila, é cultivado e produz cereais, legumes, frutas e vinho, sendo este ultimo antes da moléstia das vinhas o seu principal produto.
Nas vizinhanças da vila encontram-se varias ermidas, o farol do Cabo de Carvoeiro e o edifício arruinado do convento do Bom Jesus, fundação de 1452, que foi de franciscanos, onde está o sepulcro do fundador, o ilustre vice rei da Índia, D. Luís de Ataide.
Fabricam-se em Peniche óptimas rendas, que exporta para as principais terras do reino. As pescarias constituem o mais importante ramo do comercio desta povoação. Dão emprego a muitos barcos e braços e atraem á vila muita gente de longe e avultadas somas.
A vila de Peniche pertence á comarca das Caldas da Rainha e ao distrito administrativo de Leiria. Tem por brasão de armas uma caravela com S. Pedro e S. Paulo, um na proa e o outro na ré, sobre mar azul com ondas de prata.
Por Ignacio de Vilhena Barbosa
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Pelo Censos 2011 Peniche conta com 27 630 habitantes
Freguesias de Peniche
Ajuda, Atouguia da Baleia, Ferrel, São Pedro, Serra d'El-Rei, Conceição
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