Como é que os Visigodos entraram na Hispânia?
No outono de 409 entra na Hispânia uma bizarra aliança de povos bárbaros que tinham passado os três anos anteriores a abrir caminho pela Gália a partir da Renânia. Eram os Alanos, os Suevos e os Vândalos. Os romanos consideravam vândalos e suevos como povos germânicos, com origem em terras a leste do Reno. Quanto aos alanos, parecem ser de origem iraniana e provenientes do norte do Cáucaso. Foram provavelmente forçados a deslocarem-se para oeste nos anos seguintes à chegada dos Hunos às proximidades do Cáucaso, na década de 370. Como é que acabaram por se juntar aos vândalos e suevos nos finais de 406 na margem oriental do Reno, frente a Mogúncia (ou Mainz, no actual estado alemão da Renânia-Palatinado), não se sabe.
O que se sabe é que durante aquele inverno o rio ficou gelado e os três grupos entraram em território romano, enfrentado fraca oposição dos francos, aliados do Império. Foram abrindo caminho pelas províncias da Gália, que se encontravam sem defesa e, durante três anos por lá andaram até chegarem aos Pirinéus ocidentais em 409. Surpreendentemente, ou talvez não, atravessam as montanhas em oposição.
Isto pode explicar-se porque as guarnições romanas que controlavam as passagem das montanhas estavam ao serviço do imperador rebelde Constantino III (407-411), que tinha sido eleito pelas suas tropas na Britânia e imediatamente, aproveitando a confusão que se seguiu à sua proclamação, se tinha apoderado da Gália e da Hispânia.
O sacerdote hispânico Paulo Orósio, que em 417 escreveu "Historiæ adversum Paganos" (Histórias contra os Pagãos) afirma que os soldados de Constantino tinham deliberadamente deixado passar os bárbaros pelos Pirinéus para encobrir as suas próprias pilhagens contra a população civil. O certo é que, desde então, Honório (395-423) o legítimo Imperador Romano do Ocidente, nunca mais foi capaz de impor a sua autoridade sobre as províncias hispânicas.
Alanos, Vândalos e Suevos, depois de um breve mas selvagem período de pilhagem e destruição, devem ter acabado por estabelecer algum tipo de tratado com as autoridades romanas. As principais fontes hispânicas que abarcam este período - Orósio, que foi contemporâneo e Idácio de Chaves, que escreveu uma breve crónica do noroeste da Hispânia por volta de 468 - referem um período de fome, inanição e canibalismo, logo a seguir à entrada dos alanos, suevos e vândalos na Hispânia em 409.
A partir do momento em que os invasores se apoderaram de todos os alimentos disponíveis e condenaram as populações à fome, só tinham duas opções: ou continuavam a avançar para zonas que ainda não tinham atacado, ou mudavam a sua relação com as autoridades romanas locais. Não podiam voltar para trás, pois já tinham devastado a Gália; e ainda não estavam em condições de poder avançar para África. Para não se condenarem a si próprios à miséria que tinham causado nas populações locais, só lhes restava pactuar com o regime imperial rebelde que se implantara na Península em 409.
E estabeleceram um pacto com o imperador rebelde Máximo, cujo domínio se centrava em Tarragona e Barcelona. Máximo tinha sido proclamado imperador por Gerôncio, um dos generais de Constantino III que se rebelara contra o seu antigo imperado e em 410-411 punha cerco a Arles. Nem Máximo nem Gerôncio estavam em condições de fazer frente aos alanos, suevos e vândalos, mas podiam esperar valer-se deles para derrotar Constantino III e conseguirem o controlo da Gália.
Mas nada disto aconteceu. Durante o inverno de 410-411 os visigodos retiraram-se da Itália, o que permitiu ao exército do Imperador Honório tentar estabelecer o seu domínio sobre a Gália. E tudo aconteceu muito rapidamente durante o ano de 411. Gerôncio teve que abandonar o cerco a Arles e foi assassinado pelas suas próprias tropas e Constantino III teve que render-se a Honório, que o mandou executar. Máximo teve que se refugiar entre os seus novos aliados, alanos e vândalos, no interior da Península, enquanto aguardava o ataque dos exércitos imperiais.
Mas este ataque não ia acontecer, pois a caótica situação na Gália atrasou a tentativa de recuperar o controlo da Península Ibérica pelas forças do Império Romano. Mais ainda, esta operação militar não seria levada a cabo pelas forças imperiais, mas por um novo aliado de Roma, o rei visigodo Vália (415-419). E foi esta campanha do imperador Honório contra Máximo e os seus aliados alanos, suevos e vândalos quem trouxe pela primeira vez os visigodos à Hispânia.
Sem comentários:
Enviar um comentário