quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

História das cidades de Lisboa em 1755, parte 3 - A Oriental


História

Lisboa em 1755

3ª parte

Das Cidades de Lisboa: a Oriental


Na repartição, que, como fica dito, se fez da augusta Metrópole de Lisboa em duas Dieceses Patriarchal & Archiepiscopal, ficou chamandose Cidade Oriental a mais antiga porção della conteuda dentro de seus muros, cujos fragmentos servem em grande parte de assinalar os limites á jurisdição dos dous Prelados. Consta esta Cidade de perto de trezentas ruas com muitos largos, e terreiros, y trinta e nove Igrejas, Ermidas, e Conventos, desasseis freguezias na Cidade e dez no termo que são as seguintes.






Da Cidade de Lisboa Oriental

Na repartição, que, como fica dito, se fez da augusta Metrópole de Lisboa em duas Dieceses Patriarchal & Archiepiscopal, ficou chamandose Cidade Oriental a mais antiga porção della conteuda dentro de seus muros, cujos fragmentos servem em grande parte de assinalar os limites á jurisdição dos dous Prelados. Consta esta Cidade de perto de trezentas ruas com muitos largos, e terreiros, y trinta e nove Igrejas, Ermidas, e Conventos, desasseis freguezias na Cidade e dez no termo que são as seguintes.

A Sé de Lisboa

A Santa Sé Archiepiscopal fabrica antiquissima, e da extraordinária grandeza se crê ser obra de Constantino, Imperador do Oriente; he hum erário de preciosas reliquias e excellentes ornamentos. Na Capella mór está o corpo do invicto Martyr S. Vicente Padroeiro destas duas Cidades com urna, e retabolo de mármores lavrados, e embutidos com tanta delicadeza e formosura, que he admiração da arte, obra grande que se faz menos reparada em huma Corte, onde os antigos e modernos Santuários se adornam em exquisita profusão e capricho, como a Capella de Santo Antonio, as Igrejas e Sachristias do Convento de São Vicente de fora, e o do Collegio de São Antão, onde ultimamente se collocaram os pulpitos, que parece que não deixam esperança de se ver obra mais perfeita, a Sachristia do Convento da Graça, e sua Igreja, a Casa professa de São Roque, as Igrejas dos Padres Trinos, do Loreto, e da Incarnação, a do Convento do Sacramento, a dos Religiosos Paulistas, a das Religiosas Recoletas de S. Agostinho, que chamam do Grillo pelo sitio de sua fundação, a do Minino Deos, e para o dizer em huma palavra, em todas as Igrejas, Mosteiros, e Santuários resplandece hum admirável adornos e aceyo. Tudo, quanto nellas vem os olhos, ouro, pinturas excellentes, mármores finos lavrados,  lavrados, e embutidos com admirável idéa, gosto, e debuxo, telas de ouro, e prata, brocados, e sedas franjadas custosamente, e copiosos serviços de prata lavrada com exquisito artificio, e repartida em agradável, e proporcionada multidão pelos altares, pelos retábulos, pelos tectos, pelos aparadores, pelos pavimentos, e pelas mãoss dos ministros em custodias cruzes, castiçaes, ramalhetes, alampadas, pratos, gomís, tocheiras, thuribulos, portapazes, cereaes, lanternas, e outras peças dedicadas ao culto divino.

O Cabido da Sé 

O Cabido da Sé Archiepiscopal se cópoem de oito Dignidades, que são Deão, Chantre, Arcediago de Lisboa, Thesoureiro mór, Arcediago de Santarém, Mestre Escola, Arcediago da terceira cadeira, Arciprefte, vinte Cónegos, cada hum com hum conto de reis, quatro doze Quartanarios, dez Bacharéis, doze Capelaens, e outro grade numero de ministros. A renda da Mesa Archiepiscopal chega a cem mil cruzados. Até o presente, teve esta Igreja secenta Prelados, dos quaes os primeiros trinta e sete foram Bispos suffraganeos dos Arcebispos de Braga, até que no Reinado deiRey D. João o I, pelos annos de 1390, foy erigida a instancias do dito Príncipe em Sé Metropolitana, sendo seu primeiro Arcebispo D. João, a quem chamarão o Cavalleiro, o qual teve por successores na Mitra entre outros lllustrissimos Prelados dous Infantes deste Reyno e seis Cardeaes da Igreja Romana.

A Santa Casa da Misericórdia de Lisboa em 1755

No districto Oriental, se acha a sumptuosa Igreja e Casa de Misericordia, a primeira que teve o Reyno, pelo zelo do venerável Padre Fr. Miguel de Contreiras, Religiofo da santíssima Trindade, Confessor delRey D. João o II, o pelos annos de 1498 das relíquias da antiga Irmandade da Piedade assentada em huma das Capellas do claustro da Sé, instituio esta nobilissima Confraria para dar sepultura aos defuntos pobres, casar orfans, negocear causas de presos desamparados, e sustentallos, visitar viuvas bem procedidas, e outras muitas obras de summa piedade e edificação. Compoemse de seiscentos e vinte Irmãos, trezentos nobres, e trezentos mecânicos, e vinte letrados. Governase por hum Provedor sempre fidalgo, Escrivão, Thesoureiro, e dous Conselheiros, e seis Irmãos nobres, e outros seis mecanicos. A Igreja de três naves, e primoroso frontispicio entalhado de mármores brancos está chea de excellentes pinturas, retábulos dourados, e ricos ornamentos, tem secenta Capellaens que rezam no coro as Horas Canónicas, com mais de cem mil reis cada hum. No anuo de 1534, reinando o Senhor Rey D. João o III separou-se a irmandade do claustro da Sé para a sua nova casa em que agora se conserva. Consta esta de hum magnifico recolhimento para cincoenta e nove donzellas orfans com dotes para as casarem, de hum Hospital para pobres entrevados, de casas de despacho, de cartórios, e de outras officinas, com grande commodidade e aceyo. Administra o Hospital Real de todos os Santos e Ermida de nossa Senhora do Amparo, em que se dizem annualmente vinte mil Missas e perto de quarenta mil na Igreja da Misericordia. A sua renda he perto de cento e vinte mil cruzados; mas como as necessidades publicas são muitas e a caridade da Mesa defere facilmente com os soccoros necessàrios, se excede muito na despeza, a que concorrem extraordinariamente o Provedor e irmãos com clarissimo exemplo de catholica piedade até agora não seguido de nenhum dos Reynos estranhos.

O Governo Civil de Lisboa em 1755

O Governo civil e económico destas Cidades corre por conta dos Senados da Camara, que constam de Presidente, Vereadores, que são hoje do Desembargo delRey na Casa da Supplicação, hum Escrivão da Camara, que he fidalgo, dous Procuradores da Cidade, quatro Mestres, que elege a Mesa dos vinte e quatro do Povo, que tem voto em todas as matérias do governo económico. Provêm os Senados muitos officios de grande rendimento, como Syndico das Cidades, Conservador, Thesoureiro, Provedor dos Contos, Veador das obras, Guarda da Camara, Meirinho das Cidades, e seu Escrivão, Juiz do Tombo, seis Almotaceis, com seu Escrivão cada hum, doze Corretores, doze Escrivaes dos orfãos, doze Avaliadores, e Partidores, inquiridores dos orfãos, Corretor dos Câmbios, doze Corretores de escravos, e cavallos, quatro Inquiridores do Juízo do Civel, Juiz de ver o pezo com seu Escrivão, e dous Fieis de balança, Juiz do terreiro com feu Escrivão, e dez Capatazes das companhias da descarga, nove homens da Camara para os recados, e expediçoens do tribunal, quatro Almotaceis das execuçoens da Almotaçaria, cada hum com seu Escrivão e zelador, hum Requerente de Almotaçaria, dezoito Escrivaes dos julgados dos termos, e os Juizes das Propriedades, e dos Orfãos, e os Juizes do Crime, e Civel dos bairros das Cidades. Consiste o património dos Senados em quatrocentos moyos de pão, que lhe pagam as terras do Alqueidão, em hum real, que cobra em cada canada de vinho, e arratel de carne, a que chamam o Realete, e o seu procedido, que são trinta mil cruzados applicados para a limpeza, calçadas, pontes, e fontes dos seus termos, e oitenta e cinco mil cruzados procedidos de três reis em cada canada de vinho, e dous reis em cada arratel de carne, com outras propriedades, e direitos que cobra, que tudo foma em perto de duzentos mil cruzados.

Para a arrecadação destas rendas tem hum Almoxarife dos reaes da agua, e do vinho com Escrivão, Contador, e Executor, cinco Escrivaens das portas da Cidade, e quatro das andadas do vinho. Hum Almoxarife dos reaes da carne e seu Escrivão, e outros ministros. Juizes da balança do curral com seu Escrivão da matança para os preços das carnes. Juiz do açougue com trinta e seis cortadores. Provedor mór da saude com seu Escrivão, e interprete línguas, vinte e nove cabeças de saude repartidos pelas Freguezias das Cidades, e outros tantos coveiros. O Almoxarife do Alqueidão com Escrivão e Olheiro. O Almoxarife, Escrivão, serventes, e enfermeiros do Hospital de São Lazaro, e os guardas do Lazareto, que vulgarmente se chama a Trafaria.

 

Descripçam corografica do reyno de Portugal, 1755

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