sexta-feira, 21 de outubro de 2011

História da Cidade de Lisboa



História da Cidade de Lisboa

A CIDADE DE LISBOA

Como acontece a todas as cidades de origem antiga, a historia da fundação de Lisboa e dos seus primeiros tempos anda envolvida em mil fábulas. Umas dão-lhe Ulisses por fundador, o celebre capitão grego, dizendo que do seu nome veio á cidade o de Ullyssipo, depois corrupto em Olisipo. Outras contam que a fundou um companheiro do deus Baco, chamado Luso e que daqui tirou o país a denominação de Lusitânia e os habitantes a de lusos. Outras ainda atribuem a sua origem a Elisa, bisneto de Noé.

O que de tudo isto se pode coligir com boa razão, é que a antiguidade desta nobre povoação é tal que, havendo memorias suas anteriores á era cristã, ainda assim se esconde a sua origem nas trevas dos tempos.

Tomando pois para ponto de partida uma época conhecida, tanto por noticias históricas de todo o credito, como por monumentos, diremos que Júlio César, que morreu quarenta e cinco anos antes do nascimento de Jesus Cristo, por honrar Lisboa, que então se chamava Olisipo, deu lhe o nome de Felicitas Júlia, que queria dizer felicidade de Júlio e concedeu-lhe o foro de município romano. Aquela honra e este privilegio, de que os romanos eram muito avaros, provam de sobejo a importância e grandeza de que já nesse tempo gozava esta nossa cidade.

Como os limites que nos impusemos neste trabalho, não nos permitem fazer nem mesmo o esboço da historia de Lisboa, referiremos tão somente os principais sucessos de que tem sido teatro.

Depois de um longo período de sujeição aos romanos, destruído o império destes dominadores do mundo pelos bárbaros do norte, foi Lisboa presa a seu turno dos mesmos bárbaros. Ao principio, passou de novos a novos senhores até que os visigodos nela fixaram o seu domínio, que durou três séculos acabando no ano de 714, pela perda da batalha de Guadalete, que os moiros ganharam, assenhoreando- se em breve espaço de toda a península.

Esta invasão foi mais fatal a Lisboa que as dos povos do norte, não só porque os moiros envolveram na sua fúria e vingança os habitantes e os edifícios, mas também porque este novo domínio, dando causa a uma guerra de extermínio entre o islamismo e o cristianismo, expôs a nossa cidade aos horrores e estragos de vários assédios e conquistas.

Tomada de assalto no fim do século VIII ou principio do IX, por D. Afonso, o Casto, rei da Galiza e das Astúrias; reconquistada pelos árabes no ano de 811; novamente entrada e saqueada, em 851, por D. Ordonho III, rei de Leão; outra vez recuperada pelos sarracenos; ganha de novo, no ano de 1093, por D. Afonso VI, rei de Leão e Castela; passado pouco tempo tornada á sujeição muçulmana; foi resgatada, ,para a fé cristã e desta vez para sempre, até nossos dias, por D. Afonso Henriques, primeiro rei de Portugal, no dia 21 de Outubro de 1147, depois de um cerco de cinco meses.

Capital

Na segunda metade do século XIII estabeleceu a sua residência em Lisboa el rei D.  Afonso III, tendo sido Coimbra a corte dos quatro primeiros soberanos. Nesse mesmo século, correndo o ano de 1288, teve lugar a fundação da universidade de Lisboa por el rei D. Dinis, que foi o primeiro monarca nascido nesta cidade.

Terremoto

No ano de 1356, reinando D.  Afonso IV, padeceu esta cidade um grande terremoto, que lhe causou consideráveis estragos, arruinando a capela mor da Sé. Porém, dezassete anos depois, em 1373, sendo rei D. Fernando, sobreveio-lhe maior calamidade, por causa da guerra que se acendeu entre Portugal e Castela. Posta em apertado sitio por um numeroso exercito castelhano, experimentou muita variedade de horrores, sendo um deles o incêndio dos seus arrabaldes. Em Dezembro de 1383, por ocasião da morte del rei D. Fernando, rebentaram na cidade graves desordens e tumultos por motivo da sucessão da coroa, assassinando o mestre de Avis ao conde João Fernandes Andeiro, castelhano, nos Paços reais da Moeda, hoje cadeia do Limoeiro, no dia 3 daquele mês. E no ano seguinte veio el rei D. João I de Castela, que se intitulava rei de Portugal, por sua mulher, a rainha D. Beatriz, filha única do nosso falecido rei D. Fernando, pôr cerco a Lisboa por mar e por terra, com grande poder. Durou o cerco cinco meses, no fim dos quais se retirou o inimigo depois de muitos combates e opressão, de que ficaram como tristes vestígios muitas ruínas nos edifícios da cidade e nas embarcações do Tejo.

Glória

O século XV foi mais propicio para Lisboa, cuja grandeza e prosperidade muito deveram aos acontecimentos extraordinários que nele tiveram lugar. Em 25 de Julho de 1415, largou do Tejo a poderosa armada que conduziu el rei D. João I e os infantes seus filhos á conquista de Ceuta, que foi a pedra fundamental do poder de Portugal na África e o preludio de mais longínquas navegações e de mais largas conquistas. E no decurso desse mesmo século, viu Lisboa partir do seu magnifico porto, as armadas que conquistaram Arzila, Tanger, Alcácer Ceguer, Azamor, Safim e outras terras africanas; e as que descobriram as nossas ilhas da Madeira e Porto Santo, Açores, Cabo Verde e outras, toda a costa de África, ocidental e oriental e, enfim, a Índia e o Brasil.  A instituição da irmandade da Misericórdia, na capela de Nossa Senhora da Terra Solta, na Sé correndo o ano de 1498, foi sem duvida um digno remate para este século tão glorioso para Portugal. Todavia nele padeceu Lisboa o terrível açoite da peste.

Judeus

No século seguinte experimentou Lisboa e todo o reino as mais opostas vicissitudes da sorte. O seu primeiro quartel, apesar dos motins e matança dos judeus, que horrorizaram esta cidade em 1506, foi todo de gloria para as armas de riqueza, para o tesouro, de poderio para o soberano, de lustre para as letras, de esplendor para as artes e de prosperidade para o comercio. Lisboa viu-se o empório comercial de todo o mundo. Abrangeu todo este período no seu reinado el rei D. Manuel, que por tantas felicidades mereceu o epíteto de Afortunado.

Inquisição

No segundo quartel começou a decadência da monarquia, apesar do brilho com que as suas armas ainda continuavam a resplandecer na Índia. Estabeleceu-se o Tribunal da Inquisição, que tão nefasto foi a Lisboa e a toda a monarquia. Introduziram se os jesuítas, que trouxeram ao país benefícios envoltos em muitos males. Ateou-se novo a peste, que absorveu milhares de vidas; e sobreveio a Lisboa um terremoto no dia 7 de Janeiro de 1531, que causou lamentáveis estragos.

Terremoto, peste e Filipes

Os dois últimos quartéis do século foram para o reino e mais ainda para a capital, uma época de continuadas calamidades. Um terremoto em 28 de Janeiro de 1551; a grande peste que, em 1569, assolou Lisboa e o país; a perda del rei D Sebastião em África, no ano de 1578; a morte sucessiva de todos os membros da família real até á do cardeal rei em 1580; a invasão dos castelhanos; o desbarate do exercito de D. António prior do Crato, filho bastardo do infante D. Luís e pretendente á coroa, em Alcântara, junto a Lisboa; e, enfim, a usurpação de Filipe II, tudo nesse mesmo ano; a destruição no meio de um grande temporal da invencível armada, que saiu do Tejo contra a Inglaterra em 30 de Maio de 1588 e na qual se perderam muitas embarcações e muitíssimas vidas de portugueses; e, finalmente, a subversão de uma parte do monte de Santa Catarina, com três ruas cheias de casaria, que se sepultaram nas ondas do Tejo na noite de 22 de Julho de 1597; tais foram os lamentáveis sucessos que constituem, em breve epilogo, a historia de Lisboa na segunda metade do século XVI.

Restauração

A vinda a Lisboa de Filipe III de Espanha e família real; as festas da sua entrada na cidade; as cortes para o reconhecimento do príncipe seu filho; os excessivos rigores da opressão castelhana; a gloriosa revolução do primeiro de Dezembro de 1640, que pôs a coroa sobre a fronte de D. João IV; a conjuração do duque de Caminha, marquês de Vila Real, arcebispo de Braga e outros, em favor de Espanha, descoberta e castigada com a prisão perpetua do arcebispo e com a morte dos seus cúmplices na praça do Rossio em 29 de Agosto de 1641; a tentativa de assassínio contra D. João IV, em 1647; a heróica luta travada com a Espanha, em sustentação da nossa independência e prosseguindo com felicidade até ao cabo; as intrigas, escândalos e desordens, que se passaram na capital, desde o começo do reinado do infeliz D. Afonso VI, até a sua prisão e deposição em Novembro de 1667; foram os mais notáveis acontecimentos do século XVII.

O seguinte principiou por acender, na Europa, a guerra chamada da sucessão de Espanha, em que D. Pedro II de Portugal se envolveu, tomando o partido do arquiduque de Áustria, Carlos, que mais tarde ocupou o trono imperial da Alemanha com o nome de Carlos VI.

A 9 de Março de 1704, desembarcou em o Terreiro do Paço este príncipe, intitulando-se Carlos III, rei de Espanha. Depois de alguma demora na cidade, partiu com o exercito aliado português e inglês a invadir o pa´s vizinho e sustentar os seus direitos. Nesta luta chegou o nosso exercito, comandado pelo marquês das Minas, a tomar Madrid e aí fazer aclamar aquele príncipe.

Bartolomeu de Gusmão

No ano de 1709, teve lugar no Terreiro do Paço, a ascensão de um balão aerostatico pelo padre Bartolomeu de Gusmão e foi esta a primeira experiência que se fez na Europa, pois precedeu setenta e quatro anos a que fizeram em França pela primeira vez, em 5 de Junho de 1783, os irmãos Montgolfier, que são reputados os autores desta invenção.

Ouro do Brasil

A descoberta e exploração das minas de oiro e de brilhantes no Brasil, trouxeram a Portugal e Lisboa, principalmente, uma nova era de prosperidade grandeza e fausto. Durante o longo reinado de D. João V, desde 1707 até 1750, viu esta cidade alargar-se o seu âmbito; erguerem-se grandes edifícios do estado e religiosos; erigir-se a patriarcal; criarem-se academias e aulas publicas; povoar-se o Tejo de embarcações de guerra e sair da sua foz uma forte esquadra em defensa da Itália e contra a Turquia.

Febre Amarela

Todavia, para que não deixasse de haver sombras neste quadro de tão brilhantes cores, rebentou em Lisboa, no ano de 1723, a terrível epidemia da febre amarela, que fez inumeráveis vitimas. Alguns incêndios consideráveis vieram também, naquele período, afligir a cidade.

Terremoto de 1755




O reinado d el rei D. José I, de 1750 a 1777, é a mais memorável época dos fastos de Lisboa, por que nesse tempo tiveram lugar a sua maior desgraça e o seu maior esplendor. Aos impulsos da terra, ao embate do mar e á voracidade das chamas, derrocou-se, aluiu-se e abrasou-se a maior e melhor parte da cidade, no fatal dia primeiro de Novembro de 1755. Ao aceno del rei D. José I, auxiliado pelo génio assombroso do seu grande ministro, o marquês de Pombal, levantou-se Lisboa do seu túmulo, formosa e grandiosa, como nunca o fora.

Távoras

N essa época de ilustradas reformas em todos os ramos da administração publica e de importantes melhoramentos em todas as condições da vida económica da cidade, os outros sucessos mais notáveis foram o atentado contra a vida del rei D. José em 3 de Setembro de 1758; a execução, na praça de Belém, do duque de Aveiro, do marquês e marquesa de Távora e outros cúmplices naquele crime, em 13 de Janeiro de 1759; a expulsão dos jesuítas nesse mesmo ano; e as festas magnificas pela inauguração da estátua equestre del rei D. José, em Junho de 1775.

Academia e Casa Pia

No ultimo quartel do século XVIII, engrandeceu-se a cidade com algumas construções grandiosas, tais como a basílica do Santíssimo Coração de Jesus e Cordoaria; principiou- se o novo palácio real da Ajuda, no mesmo sitio em que acabava de arder uma grande parte do palácio velho; projectaram-se e começaram-se outras grandes obras, que não se concluíram; instituiu-se a academia real das ciências, a biblioteca publica e a Casa Pia, tudo fundação da rainha D. Maria I. Visitaram Lisboa e residiram aqui por algum tempo o príncipe de Gales, depois Jorge IV e outros príncipes seus irmãos, duas princesas marroquinas e um outro príncipe africano.

Invasões francesas, Constitucionalismo e Guerra Civil

No século actual (19), tem sido Lisboa teatro de muitos e mui graves acontecimentos, tais como: a partida da família real para o Brasil, em 29 de Novembro de 1807, acompanhada de uma grande parte da nobreza elevando imensos capitais; a entrada do exercito francês logo no dia seguinte; o seu embarque precipitado daí a nove meses; a execução dos primeiros mártires da liberdade, em 1817, no campo de Santa Ana e junto á torre de S. Julião da Barra; a revolução de 1820, que proclamou a monarquia constitucional; o regresso del rei D. João VI e sua família em 1821; a contra revolução que reestabeleceu o poder absoluto em 1823; as festas e regozijos em Julho de 1826 pelo juramento da Carta Constitucional, outorgada por el rei D. Pedro IV, na sua elevação ao trono português; a guerra civil entre os partidos liberal e absolutista, que produziram a usurpação da coroa da senhora D. Maria II em 1828 e a sua restauração em 1833, na qual obraram prodígios de valor os defensores dos seus direitos, capitaneados por seu augusto pai, o imortal duque de Bragança, ex-imperador do Brasil e rei de Portugal; e as lutas sangrentas entre as fracções do partido liberal até ao começo do reinado del rei, o senhor D. Pedro V.

Epidemia de Cólera

Neste período, foi assolada por três mortíferas epidemias: a cholera morbus em 1833 è 1856 e a febre amarela em 1857.

Todavia, apesar de tantos infortúnios e contrariedades, o seu engrandecimento e aformoseamento têm sido tão progressivos e maravilhosos, desde que se restaurou a liberdade em 1833, que se pode dizer, sem receio, que operaram uma completa transformação nesta cidade. Faríamos uma longa resenha se houvéssemos de enumerar todos os melhoramentos, morais e materiais, com que a têm dotado o governo, por meio de varias reformas ilustradas e as suas câmaras municipais, por via de incessantes esforços patrióticos no desempenho de suas árduas funções. A sua situação geográfica e o impulso natural da civilização europeia, preparam-Ihe um futuro brilhantíssimo.

Visitas importantes

Neste período de 1833 para cá, Lisboa tem sido visitada de muitos príncipes e princesas das principais famílias soberanas. Especificaremos os seguintes: a rainha Adelaide, viúva de Guilherme IV de Inglaterra; a rainha Cristina, mãe da rainha Isabel de Espanha; o duque soberano de Saxe Coburgo; o duque Fernando, pai del rei, o senhor D. Fernando e os seus filhos, os príncipes Augusto e Leopoldo; a princesa Clementina, filha do rei Luís Filipe; o príncipe e princesa de Joinville; o duque e duquesa de Nemours; o duque d'Aumale; o duque de Montpensier e sua esposa, a infanta D. Maria Luísa, irmã da rainha de Espanha; o arquiduque Maximiliano, irmão do imperador da Áustria; o grão duque Constantino, irmão do imperador da Rússia; o príncipe Adalberto, irmão do rei de Baviera; o príncipe de Gales e o príncipe Alfredo, filhos da rainha Vitoria; o duque de Cambridge, primo desta soberana; o conde de Paris, neto do defunto rei Luís Filipe; o príncipe de Orange, filho herdeiro do rei de Holanda; o principe Guilherme da Prússia, sobrinho do rei deste estado; Ibrahim Pachá, filho de Mehemet Ali, vice rei do Egipto; o príncipe Leopoldo de Sigmarigen, etc.

No antigo regímen Lisboa gozava de voto em cortes com assento no primeiro banco. Tem por brasão um escudo coroado e nele uma nau, com um corvo á popa e outro á proa, o qual lhe foi dado por D. Afonso Henriques, em memoria do navio com os dois corvos, que no seu tempo, transportou a esta cidade o corpo de S. Vicente, encontrado no cabo deste nome, no reino do Algarve.

Situação e Clima

Lisboa está situada sobre a margem direita do Tejo, a duas léguas da sua foz, que tanta distancia vai daí até Belém, onde principia a erguer-se a cidade. Conta perto de duas léguas de extensão, de este a oeste desde Belém até Xabregas; e meia légua de largura, de norte a sul, desde o Tejo até ás barreiras de Campolide.

A sua situação é sumamente aprazível e o seu clima dos mais temperados e benéficos da Europa. Sentada em majestoso anfiteatro, sobre varias colinas que ostentam, como em exposição artística, templos, palácios e jardins; banhada pelas águas do Tejo que, misturando-se com as do oceano, formam diante da cidade um vasto golfo, sulcado continuamente por tanta infinidade e variedade de embarcações nacionais e das diversas potencias europeias; precedida e seguida á beira mar de lindos arrabaldes, onde avultam formosos monumentos de eras afortunadas, belas quintas e casas de campo; Lisboa oferece aos viajantes que demandam o seu porto, um dos mais grandiosos e encantadores panoramas que se encontram em todo o globo.

Porto

O seu porto é um dos mais amplos e seguros do mundo; e hoje atenta a crescente prosperidade do Brasil e o começo do desenvolvimento da África ocidental, é o mais adaptado para um grande empório comercial que, certamente, se estabelecerá, logo que um caminho de ferro, secundado pela telegrafia eléctrica, nos ponha em imediata comunicação com toda a Europa. Desde a barra até á praça do Comercio, a sua largura regula por meia légua. Depois forma uma grande bacia ou reconcavo, na parte do sul, que lhe dá duas léguas de largo, entre o arsenal do exercito e a vila do Barreiro; e três léguas, entre Braço de Prata, arrabalde oriental da cidade e a vila d Aldeia Galega.

Fortalezas e Fortes

A barra é defendida pelas fortalezas de S. Julião e de S. Lourenço ou do Bugio, edificadas em frente uma da outra, mediando um espaço de mais de uma milha. A primeira foi começada por el rei D. João III, continuada por D Sebastião e cardeal rei D. Henrique e terminada por Filipe II de Espanha; e a segunda teve principio no governo de D. Sebastião e concluiu-se durante a usurpação castelhana.


Vários fortes, construídos em diferentes épocas, guarnecem as duas margens do Tejo, desde a sua foz até à cidade. Anteriormente á fundação daquelas fortalezas, a defesa do porto de Lisboa estava confiada á torre de S. Sebastião de Caparica, vulgarmente chamada Torre Velha, e á torre de S. Vicente de Belém, que cruzavam as balas da sua artilharia. Aquela, reconstruída por el rei D. Sebastião, mas cuja primeira fabrica foi obra de D. João I, serve actualmente de lazareto. A de S. Vicente, projectada por D. João II e executada por el rei D, Manuel, é ao presente fortaleza de registro e ao mesmo tempo um dos mais lindos e curiosos monumentos de arte da capital.

Divisão Eclesiástica

A respeito da divisão civil eclesiastica de Lisboa dá-se uma circunstancia notável e talvez única na historia das grandes povoações; e vem a ser que, nas diversas alterações porque tem passado aquela divisão, ora tem sido diminuída, ora aumentada a cidade pelo simples efeito de um decreto. Quando se instituiu a patriarcal, D. João V dividiu Lisboa em duas cidades distintas, com dois senados da câmara e mais autoridades respectivas e em duas dioceses com prelados separados. Uma denominando-se Lisboa Oriental, continuou a ser sede de um arcebispo. A outra, a que se deu o nome de Lisboa Ocidental, foi erigida em patriarcado. No fim porém de alguns anos, foi extinto o arcebispado; e reunidas as duas cidades, tornaram as coisas ao estado anterior sob o governo eclesiastico de um patriarca.

El rei D. José, vendo o arrabalde de Belém povoar-se e crescer até pegar com a cidade, incorporou-o nela, decretando que fosse considerado como um dos seus bairros. De então para cá têm-se estreitado mui consideravelmente os laços que prendem o novo bairro aos antigos da cidade. a ponto de formarem uma não interrompida povoação- Todavia há sete para oito anos foi restringido o âmbito de Lisboa. criando-se os dois novos concelhos de Belém, para o ocidente e dos Olivais, para o oriente.

Entretanto, apesar desta divisão contraria á ordem natural do desenvolvimento das cidades, continuaremos a considerar Belém como parte integrante, que é, de Lisboa.

Não nos permitindo os limites deste nosso trabalho que historiemos todas as mudanças que tem havido na organização geral da cidade, falaremos só da actual.

Bairros

Divide-se administrativamente a capital em quatro distritos ou bairros, chamados de Alfama, Rossio, Bairro Alto e Alcântara, cada um com seu administrador, fora outras autoridades subalternas. Judicialmente está dividida em seis bairros ou julgados, presididos por seis juízes de direito, que dão audiência no extinto convento da Boa Hora e constituem, com os jurados, o tribunal de primeira instância. No mesmo edifício funcionam três juízes de policia correccional e os dos órfãos. A divisão fiscal compõe-se de recebedorias, de freguesia, cada uma das quais abrange de ordinário duas e três paroquias e é dirigida por um recebedor sob a fiscalização de um escrivão de fazenda. Quanto ao militar, tem uma guarnição composta de quatro regimentos de infantaria, dois batalhões de caçadores, um regimento de lanceiros, um regimento de artilharia e um batalhão de sapadores, com um general comandante da força armada. E a policia da cidade é feita por dois regimentos da guarda municipal, um de infantaria e outro de cavalaria e por cabos de policiam uns tantos por cada freguesia, sob as ordens de um regedor de paroquia.

A organização municipal consta de uma câmara municipal com treze camaristas, eleitos de dois em dois anos e entre os quais se reparte o governo da cidade, por pelouros da iluminação, da limpeza, das obras dos jardins e passeios públicos, etc.

Eclesiasticamente está dividida em trinta e nove freguesias, incluindo Belém.

Como capital de distrito, do patriarcado e de toda a monarquia, Lisboa é sede da corte, das duas câmaras legislativas, dos ministérios do reino, guerra, fazenda, justiça, marinha, estrangeiros, obras publicas comercio e artes; do conselho de estado; do cardeal patriarca; do supremo tribunal de justiça; dos tribunais da relação, do comercio, de primeira e segunda instância, do supremo conselho de justiça militar, da relação eclesiastica e do tribunal de contas; do conselho ultramarino; de um governador civil; de um general comandante da primeira divisão militar do reino; e de uma infinidade de repartições dependentes dos diversos ministérios.

Sé de Lisboa


Não é conhecida ou é muito duvidosa a época da instituição da diocese lisbonense. A noticia autêntica mais antiga que dela se encontra, é respectiva ao ano de 589, em que era bispo de Lisboa um prelado chamado Paulo. Com a invasão dos moiros, perdeu a cidade esta preeminencia, que recuperou logo depois de tomada por D. Afonso Henriques, sendo nomeado bispo D. Gilberto. El rei D João I alcançou do papa Bonifácio IX, por bula de 10 de Novembro de 1394, a erecção desta igreja em metropolitana e foi seu primeiro arcebispo D. João Annes. Entre os arcebispos seus sucessores, contam-se seis cardeais, três destes príncipes, D. Jaime, filho do infante D. Pedro duque de Coimbra e neto de D. João I; o infante D. Afonso e o infante D. Henrique, filhos del rei D. Manuel. A instâncias del rei D. João V, o papa Clemente XI erigiu em patriarcado a parte Ocidental da cidade de Lisboa e do arcebispado, por bula de 7 de Novembro de 1716; e por solicitação do mesmo soberano, foi extinto o arcebispado e unido ao patriarcado, por bula de Benedito XIV, datada de 13 de Dezembro de 1740. A patriarcal foi criada com tão grandes privilégios e com tamanho fausto e grandeza que, nas funções religiosas, era uma imitação em ponto mais pequeno da corte do sumo pontífice. Por um destes privilégios, os patriarcas são declarados cardeais pelo papa no primeiro consistório, depois da sua nomeação. O primeiro patriarca foi D. Thomas de Almeida, da casa dos senhores marqueses de Lavradio, sendo transferido do bispado do Porto.

Igrejas e Conventos

Lisboa encerra mais de duzentos templos, vinte e cinco dos quais pertencem a conventos de religiosas, que são umas trezentas, presentemente. O primeiro em antiguidade e hierarquia é a Sé Patriarcal. É muito incerta a época da sua fundação. Uns a atribuem a D. Afonso Henriques; outros aos moiros; e outros ainda a eras muito mais remotas. As ruínas que lhe têm causado vários terremotos e as reconstruções que tem tido, alteraram numas partes e destruíram noutras as feições primitivas do monumento. É um grande templo de tres naves que, apesar de tudo, contém algumas antigualhas curiosas. Na capela mor estão os túmulos de D. Afonso IV e da rainha D. Beatriz. Também aí se acham sepultados outros príncipes, arcebispos e muitas pessoas distintas. Possui vasos sagrados e alfaias de muita riqueza e primor artístico.


As outras igrejas mais notáveis são: Santa Maria de Belém, outrora pertencente ao mosteiro de monges de S. Jerónimo e hoje paroquia; foi edificada por el rei D. Manuel em agradecimento e memoria do descobrimento da Índia e no próprio sitio onde embarcou Vasco da Gama para essa ousada empresa. É um formoso e magnifico monumento do ultimo período da arquitectura gótica. Nele repousam, em túmulos de mármore, o fundador e sua segunda mulher, D. João III e a rainha D. Catarina, el rei D. Sebastião ou uns ossos que vieram de África como seus, o cardeal rei e vários infantes filhos del rei D. Manuel e D. João III.

A basílica do Coração de Jesus, fundada pela rainha D. Maria I em 1779. É um templo muito sumptuoso, construído de ricos mármores, com infinita variedade de belas esculturas. Na capela mor jaz, em soberbo mausoleo, a rainha fundadora.

S. Vicente de Fora, que pertenceu ao convento dos cónegos regrantes de Santo Agostinho, actualmente residência do cardeal patriarca. Da primitiva fabrica, que foi obra de D. Afonso Henriques, nada existe. Tudo o que se vê foi reconstrução de Filipe II de Castela, pouco depois de usurpar a coroa de Portugal. É uma grande e rica igreja de tres naves, também construída de bons mármores de cores e enriquecida de algumas obras de mosaico. Ao lado da capela mor, está o jazigo dos patriarcas e, por trás daquela, o real panteão da casa de Bragança, desde el rei D. João IV, que descansa num magnifico túmulo.


A igreja de S. Roque, que foi dos jesuítas e agora é da Misericórdia, é notável pela riquíssima capela de S. João Baptista, mandada fazer em Roma por el rei D, João V, armada e benzida dentro da igreja de S. Pedro pelo papa Clemente XIV, que nela disse a primeira missa; e que custou dois milhões de cruzados, com os vasos sagrados, paramentos e mais alfaias que aí se conservam. É fabricada de verde antiquo, porfido, jaldo, alabastro, lapis lazuli, ametistas e cornelina. Os três painéis de mosaico são admiráveis.

S. Domingos, igreja outrora do convento dos frades dominicos e ao presente paroquia de Santa Justa. Foi reconstruída inteiramente depois do terremoto de 1755. É um templo vastíssimo, de uma só nave, todo guarnecido de belas colunas colossais de mármore cor de rosa, Os painéis são de Pedro Alexandrino, um dos nossos pintores mais estimados dos fins do século passado (18).

Nossa Senhora dos Mártires, a mais antiga das paroquias de Lisboa, fundada por D. Afonso Henriques no sitio onde se enterraram os estrangeiros que morreram em seu auxilio no assedio e tomada de Lisboa. Destruída em 1755 pelo terremoto, foi logo depois reedificada com profusão de bons mármores.

A igreja paroquial de Nossa Senhora da Encarnação é um grande templo, levantado depois do terremoto.

A igreja de Jesus, que foi dos religiosos terceiros franciscanos e agora é paroquia de Nossa Senhora das Mercês e a igreja dos Paulistas, que foi dos frades da congregação da Serra d' Ossa e ao presente é freguesia de Santa Catarina, são dois vastos e ricos templos. Este foi começado em 1647 e escapou ao terremoto. Aquele, derrocado completamente por este cataclismo, é reconstrução posterior.

As igrejas paroquiais de S. Nicolau e S. Julião, cuja reedificação se concluiu há poucos anos, são dois belos templos, em que se admiram magníficos mármores de cores e excelentes esculturas. O tecto do primeiro foi pintado pelo senhor Fonseca e o do segundo pelo senhor Joaquim Rafael, ambos lentes de pintura da academia das belas artes.

A igreja de Nossa Senhora da Graça que pertenceu aos eremitas de Santo Agostinho e actualmente paroquia de Santo André e Santa Marinha, é recomendável pelo santuário do Senhor dos Passos, por alguns bons quadros e pelo riquíssimo túmulo de mármore e bronze com lindos mosaicos em que jaz D. Mendo de Foios, secretario de estado de D. João V, o qual se acha na sacristia. Junto á casa do capitulo do convento contíguo, que ao presente é quartel militar, está a sepultura do grande Afonso de Albuquerque.


A igreja de Santo António, fundada por el rei D. Manuel e, por disposição testamentaria de D. João II no próprio lugar das casas em que nascera o Taumaturgo; arruinada pelo terremoto de 1755 e reedificada desde os alicerces por el rei D. Pedro III, é um templo fabricado com riqueza, mas de uma arquitectura acanhada e mesquinha, principalmente no exterior. É administrado pela câmara.


A igreja de Nossa Senhora do Loreto, freguesia dos italianos residentes na capital, erigiu-se no século XVI, ardeu a primeira vez em 1651 e a segunda em 3 de Novembro de 1755, tendo ficado ilesa do terremoto. É um bom templo; contudo muito menos sumptuoso nesta ultima reedificação que na anterior.

A igreja de Nossa Senhora do Livramento, chamada vulgarmente da Memoria, em Belém, fundada por el rei D. José, no sitio onde lhe deram os tiros e em agradecimento por ter escapado deste atentado, é toda de mármore por dentro e com uma cúpula de cantaria.


A igreja da Conceição Velha é digna de especial menção pelo seu formoso pórtico e janelas de architectura gótica. Era aqui a grandiosa igreja da Misericórdia, obra del rei D. Manuel. Destruída pelo terremoto, menos a capela do Santíssimo e a porta travessa que lhe ficava fronteira, aproveitaram-se na reedificação, a primeira para capela mor e a segunda para porta principal de um templo de muito menores dimensões, que se deu aos freires de Cristo com a invocação de Nossa Senhora da Conceição, em troca de outra igreja deste nome que eles possuíam e que teve de demolir se por ocasião da nova edificação da cidade.


A igreja arruinada do Carmo, que o ilustre Condestável D. Nuno Álvares Pereira fundou em memoria da celebre batalha de Aljubarrota, a qual o terremoto passado arruinou, é ainda assim um dos nossos monumentos históricos mais respeitaveis.

A igreja, por acabar, de Santa Engrácia, começada no século XVII, é um colosso de pedraria de arquitectura pesada e original.

Praças, Largos e ruas

Contam se em Lisboa treze praças principais, cinquenta e dois largos, trezentas cinquenta e sete ruas, duzentas e dezasseis travessas, sessenta e cinco calçadas e cento e dezanove becos. As praças mais belas são as seguintes. A do Comercio, vulgo Terreiro do Paço, vastíssima, com três magníficos cais sobre o Tejo, cercada dos palácios das secretarias de estado, alfandega e outras repartições, é ornada no centro com a estátua equestre de D. José I, obra do insigne escultor Joaquim Machado de Castro e fundida por Bartolomeu da Costa. A estátua equestre, fora o pedestal, tem trinta e um palmos e meio de altura, é de bronze e tem de peso oitenta mil seiscentos e quarenta arrateis. Foi inaugurada em 27 de Maio de 1775, com extraordinarias festas.

A Praça de D. Pedro, antigamente do Rossio, é grande e também regular. No lado do norte ergue-se o majestoso teatro de D. Maria II e, no centro, está principiado um monumento a D. Pedro IV.

A Praça da Figueira serve de mercado.


A Praça do Pelourinho é mais pequena que as precedentes. Guarnecem-lhe os lados de leste e do sul os edifícios do banco de Portugal e do arsenal da marinha. No meio eleva-se uma esbelta coluna vasada e inteiriça, que foi Pelourinho.


A Praça dos Romulares, com um cais sobre o rio, é pequena mas regular e orlada de bons prédios e de árvores.

A Praça da Ribeira Nova é o mercado do peixe, também com um cais.

A Praça de S. Paulo, com a igreja paroquial deste santo, é guarnecida de árvores e tem no centro um belo chafariz.

A Praça da Alegria é toda plantada de arvoredo, com bonitas casas em volta.

A Praça nova ao Loreto, cujo terreno estava há pouco ocupado com os restos do velho palácio dos marqueses de Marialva e com vários casebres edificados nas suas ruínas. Todos os prédios que a cercam são de arquitectura regular.

O Largo do Carmo, arborizado e com um bom chafariz, tem em redor prédios regulares e a velha igreja do Carmo.

Campo de Santa Ana é uma grande praça modernamente aformoseada com passeio de arvoredo ajardinado. De entre muito bons edifícios que a guarnecem, sobressai a rica e linda casa do senhor Costa Lobo.

A Praça de D. Fernando II, antigamente Largo de Belém, é uma vasta praça orlada de árvores, banhada pelo Tejo do lado do sul, onde tem um óptimo cais e decorada do lado do norte pelo palácio do picadeiro real e pelos jardins do real paço de Belém.

A Praça do Príncipe Real, antigamente da Patriarcal Queimada, é arborizada e vai ter melhoramentos.


As melhores ruas são as cinco, que saem da praça do Comercio: rua Augusta, Áurea, Bela da Rainha, Nova da Alfandega, e do Arsenal, as ruas Nova del rei, Nova do Almada, Nova do Carmo, Chiado, de S. Francisco, do Alecrim, Larga de S. Roque, da Escola Politecnica, da Fabrica das Sedas, Direita da Junqueira, etc.

Palácios Reais

Os palácios reais são os da Ajuda, e Belém, das Necessidades e Bemposta.


O da Ajuda foi começado pelo príncipe regente D. João, logo depois do incendio que, pelos anos de 1795, devorou uma grande parte do palácio velho da Ajuda, construído á pressa, de madeira, para residência del rei D. José e sua familia, depois que o terremoto de 1755 lhe destruiu os paços da Ribeira, O novo paço, devido aos arquitectos José da Costa e Silva e Francisco Xavier Fabri, apenas tem levantada uma terça parte da sua planta geral, mas ainda assim, no que está feito, que já tem custado muitos milhões de cruzados, se poderia acomodar uma numerosa familia real- Encerra muitos e espaçosissimos salões e está decorado com grande numero de estatuas de mármore e de pinturas dos nossos melhores escultores e pintores modernos.


O palácio das Necessidades é a residência ordinaria del rei e familia real. Foi mandado fazer por D. João V, para hospedagem dos principes estrangeiros que visitassem esta cidade. Ao presente acha-se interiormente ornado e guarnecido com muita elegancia e riqueza. Contém numerosos objectos de arte de muita valia e primor em pintura e escultura, um rico museu organisado por el rei, o senhor D. Pedro V e pelo senhor infante D. Luís, uma boa livraria e uma bela colecção de armas antigas, pertencente a el rei, o senhor D. Fernando. A quinta contigua é muito formosa, tanto pelo gosto com que está plantada, como pela riquissima colecção de plantas exoticas que possui.



O palácio de Belém foi comprado ao conde de Aveiras por el rei D. João V, que o melhorou e cercou de jardins ornados de cascatas, lagos, estatuas, vasos e viveiros. Tem uma quinta com lindas ruas de bosque. Costuma servir este palácio para os bailes da corte, No topo da quinta está um palacete chamado do Patio das Vacas, porque a sua entrada principal deita para um pequeno largo ou pátio deste nome.

O palácio Velho está imediato ao novo da Ajuda. É a parte que escapou ao incêndio e que, apesar disso, é um grande edifício que estende uma das suas frentes pelo jardim botanico.


O palácio da Bemposta foi fundado pela rainha de Inglaterra, D. Catarina de Bragança, viuva de Carlos II de Inglaterra e filha do nosso rei D, João IV. Nele viveu nos seus óptimos anos el rei D. João VI e aí faleceu a 10 de Março de 1826. A capela contém alguns quadros de merecimento e boas obras de escultura. É Colegiada, servida por cónegos. Neste palácio acha-se estabelecida a escola do exercito. Tem uma extensa quinta.

Arsenais

Há na cidade quatro arsenais, um de marinha e tres do exercito. O primeiro é magnifico. É obra do marquês de Pombal. Está hoje muito melhorado. Possui um soberbo dique, uma caldeira, dois estaleiros excelentes, oficinas grandes, armazens e uma vasta sala do risco, onde há uma corveta para exercício dos aspirantes.

Dos três arsenais do exercito o chamado Fundição de baixo, teve por fundador el rei D. João V, posto que geralmente se crê ser D. José I. Tem um rico pórtico de cantaria, ornado de colunas e troféus. Encerra, além dos armazéns e oficinas, varias salas de armas.

O chamado Fundição do Campo de Santa Clara guarda um curioso deposito de peças de artilharia antigas, tomadas pelos portugueses em diversas batalhas. Tem a celebre colubrina de Diu e muitos e lindos canhões espanhóis, franceses, ingleses e holandeses. No mesmo edilicio está um museu de maquinas, de armas e de diversas antiguidades e curiosidades.

O arsenal denominado Fundição de cima contém, além das oficinas de fundição e outras, o modelo da estátua equestre.

Teatros

Os teatros são sete. S. Carlos, de opera italiana, edificado em 1793, grande e bem decorado, com cinco ordens de camarotes e uma esplêndida tribuna real.


O Teatro de D. Maria II, de declamação, começado em 1844 e concluído em 1847. É um sumptuoso monumento com quatro frentes, todas de mármore, ornado de colunas, estatuas, altos e baixos relevos. As decorações interiores também são ricas. Tem quatro ordens de camarotes, com tribuna real. Está edificado no sitio onde esteve o antigo palacio dos Estáos, depois transformado em inquisição e depois, ainda, em palácio do tesouro publico que, ardendo em 1836, deu ocasião a edificar-se o teatro. Teve este por arquitecto Fortunato Lodi.

O Teatro de D. Fernando, de declamação, construído pelo arquitecto francês Arnould Bertin, nos restos por acabar da igreja de Santa Justa. Foi inaugurado em 1849. Tem quatro ordens de camarotes e camarote real particular.

O Teatro do Ginasio, de comédia e farsa lírica, concluido em 1852, pelos desenhos dos senhores Rambois e Cinatti. Tem três ordens de camarotes, com camarote particular para a familia real.

O Teatro da rua dos Condes, de declamação, é fundação da segunda metade do século passado (18). É pequeno e mal construido e decorado.

O Teatro das Variedades, de declamação, é o antigo teatro do Salitre, também do século passado (18) e, como o anterior, de péssima construção e pobremente ornado. Tem tres ordens de camarotes e um deles da família real.

O Café Concerto é um belo edificio construido há três anos. Encerra um grande e elegante salão onde se costumam dar bailes de mascaras durante todo o carnaval e um teatrinho para farças líricas francesas. Além destes ha varios teatros particulares.

O circo do Campo de Santa Ana, para corridas de toiros, erigido em 1829; o circo do Salitre, para exercicios equestres e ginasticos, feito no século passado; a Floresta Egípcia, com um salão para bailes de mascaras no carnaval; completam os espectaculos públicos da capital.

Jardins


Jardins e passeios conta Lisboa os seguintes. O Passeio Publico, foi plantado pelo marquês de Pombal, aumentado e muito melhorado desde 1833 para cá, com pórticos e gradaria de ferro em volta, com uma nova plantação dirigida com mais gosto, com uma cascata, quatro lagos, tendo um destes cento vinte e nove pés de circunferencia e três estátuas de mármore, duas que representamos rios Tejo e Douro, feitas por Alexandre Gomes, falecido em 1801 e discipulo do insigne escultor italiano Alexandre Justi; e a outra representando uma nayade, obra do sinzel do senhor Assis, lente da academia de belas artes.

O Passeio da Estrela, o maior e mais belo de todos os que estão dentro da cidade, delineado e plantado com muito bom gosto em 1850, cercado de grades de ferro e aformoseado com diversas construções nos anos seguintes. Contém uma excelente e copiosa colecção de árvores de bosque e plantas de jardim, uma cascata, quatro lindissimos lagos, estufa, elegantes pavilhões, caramachões, etc.

O Passeio de S. Pedro de Alcântara, começado em 1833 para 1834. A sua situação elevada proporciona aos que o visitam um delicioso e variado panorama. Na parte superior tem um copado bosque e na parte inferior jardim com dois lagos, cascata e vários bustos.

O Jardim da Alfandega, estende-se pela frente da alfandega grande, ao longo do Tejo. Tem uma pequena estufa.

O Passeio da Junqueira, situado junto ao Tejo e correndo paralelo à rua direita da Junqueira, que é guarnecida de belos palácios. Foi plantado nos fins do reinado da rainha D Maria I.


O Passeio do Campo Grande é fora da cidade, mas a pouca distancia das barreiras. Foi plantado no reinado de D. Maria I, por ordem de D. Rodrigo de Sousa Coutinho, ministro do reino. Tem perto de um quarto de légua de extensão e é o único passeio para carruagens e cavaleiros. Consta de largas e copadas ruas de bosque e vários jardins. As duas estradas que correm dos lados de fora e junto dele, são orladas de casas de campo e jardins. Neste passeio faz se em Outubro uma grande feira mui concorrida.

Aqueduto


O grande reservatorio das Amoreiras e o aqueduto das Águas Livres, formam o mais grandioso monumento de Lisboa. Toda esta obra foi traçada e executada pelo engenheiro Manuel da Maia e por ordem de D. João V. Teve principio em 1729 e no fim de vinte anos estava concluido o aqueduto. A construcção do reservatorio prolongou-se pelos seguintes reinados vindo a terminar-se em 1834. O aqueduto corre ora soterrado ora sobre arcos que, ao todo, em sitios diversos, são cento vinte e sete. Os mais celebrados, pelo arrojo e elegância da construção, são chamados por antonomasia «Os arcos das aguas livres». É a maior e mais atrevida obra deste género que há na Europa. Tem esta ponte-aqueduto trinta e cinco arcos que sustentam a galeria por onde vêm os canos da agua e dois passeios para gente de pé, um de cada lado. O arco grande conta duzentos e trinta pés e dez polegadas de altura e cento e sete e oito polegadas de largura. A maior elevação de todo o monumento é de duzentos sessenta e tres pés. Resistiu ao terremoto. O reservatório leva perto de onze mil pipas de agua. A extensão das diversas galerias do aqueduto, longitudinal e transversais, perfaz a soma de sete léguas.

Chafarizes


Lisboa é abastecida de agua por muitas fontes e chafarizes, uns alimentados por aquele aqueduto e outros por mananciais que nascem do monte do castelo de S. Jorge. Os de melhor fabrica: são o das Necessidades, no largo em frente do paço, com um esbelto obelisco; o das Janelas Verdes. com uma boa estátua de Vénus; o de Belém; o de Alcântara, com uma acanhada estátua de Neptuno; o da praça de S. Paulo, com uma engraçada pirâmide; o da Esperança; o do Carmo, com os seus quatro arcos formando um como pavilhão; e enfim, a humilde fonte da Samaritana, junto a Xabregas, como memoria da sua illustre fundadora, a rainha D. Leonor mulher de D. João II e irmã del rei D. Manuel.

Hospitais


Os principais hospitais da cidade são sete. O de S. José, é o primeiro e pode comparar-se no seu serviço aos melhores estrangeiros. Ocupa o antigo convento de Santo Antão, que foi dos jesuítas, começado em 1579. Tem dez enfermarias de cirurgia e sete de medicina. Encerra ordinariamente para cima de mil enfermos. A botica, laboratório químico, deposito de roupas, cozinha, dispensa e outras mais oficinas são magnificas. Possui cerca e um jardim botânico.

O Hospital do Desterro, no edilicio do extinto convento de Nossa Senhora do Desterro de monges de S. Bernardo, é uma delegação do de S. José.

O Hospital de Rilhafolhes, no extinto convento dos congregados da missão de S. Vicente de Paulo, é de alienados de ambos os sexos. Tem uma grande cerca e um belo estabelecimento de banhos públicos e para uso do hospital, construído em 1851.

O Hospital de S. Lázaro, para moléstias cutâneas contagiosas e crónicas.

O Hospital da Marinha, para os doentes da armada e repartições da marinha. Foi edificado expressamente para este serviço por mandado do príncipe regente D. João e principiou-se em 1797. É um belo edifício, situado em terreno alto, com extensa vista de cidade e mar. Tem doze enfermarias e grandiosas oficinas.

O Hospital da Estrela, para militares, no extinto convento de Nossa Senhora da Estrela, de monges de S Bento.

O Hospital de Belém, também militar, no extinto convento da Boa Hora.

Além destes há muitos outros hospitais de confrarias e irmandades; a Casa de Saude, hospital particular que recebe doentes pagando um tanto por dia e dois hospitais estrangeiros, o de S. Luís, rei de França, dos franceses e o dos Ciprestes, dos ingleses.

Ha mais os seguintes estabelecimentos de caridade. A Santa Casa da Misericordia, asilo dos expostos, no antigo convento de S. Roque, dos jesuítas, fundado em 1567, e a instituição da Misericordia no fim do século XV, no reinado de D. Manuel. Tem a seu cargo, dentro e fora do edifício mais de dez mil enjeitados. A Casa Pia, asilo e casa de educação de órfãos pobres, no antigo mosteiro de Santa Maria de Belém, de monges de S. Jerónimo. Fundou esta instituição a rainha D. Maria I em 1783. Em 1834 passou do edificio do Desterro para o actual, sendo então este estabelecimento pio reformado e melhorado e continuando a ter progressivos melhoramentos. Contém de oitocentos a novecentos alunos, de ambos os sexos e um colégio de surdos mudos, para todos os quais há mestres e oficinas de todas as artes liberais e ofícios mecânicos. O edifício, obra del rei D. Manuel, como já dissemos falando da igreja, tem partes de muita riqueza artística, como o claustro, refeitório casa do capitulo por acabar etc. O Asilo da mendicidade, instituido no reinado da senhora D. Maria II no extinto convento de Santo António dos Capuchos, fundado em 1570 e reedificado depois do terremoto. Os pobres de ambos os sexos aqui recolhidos regulam por novecentos. Asílos da infância desvalida há diversos na cidade e um no Campo Grande, em edifício construido expressamente para esse fim pelo corpo do comercio de Lisboa, em comemoração da exaltação ao trono de sua magestade o senhor D. Pedro V. Esta instituição data de 1834 e tem por protectora sua magestade a imperatriz duquesa de Bragança. O Asilo de Nossa Senhora da Conceição, de raparigas abandonadas, é de fundação recente. Ha um recolhimento de irmãs de caridade.

Cadeias

Há na cidade quatro cadeias. A do Castelo, para militares; a do Limoeiro, para presos civis; a do Aljube, que serve actualmente para mulheres; e a da Galé, dentro do arsenal da marinha, para os condenados a trabalhos públicos. A do Limoeiro foi o antigo paço real da Moeda, onde morou el rei D. Fernando e onde o mestre de Avis, depois rei D. João I, assassinou o celebre valido da rainha D. Leonor Teles, chamado João Fernandes Andeiro, conde de Ourem. As torres da barra e a de Belém já têm servido de prisão e têm casas proprias para isso.

Quartéis

Os quarteis de tropa são dez. O do corpo de marinheiros, em Alcantara, edificado há pouco, é o mais belo e melhor de todos. O dos lanceiros, na calçada d Ajuda, também é grandioso. O de infantaria nº 1, na mesma calçada, é vasto e tem no meio uma grande praça de parada. O de S João de Deus, de infantaria nº 2, ocupa o convento que foi dos hospitaleiros de S. João de Deus, fundado no século XVII. É um bom edificio. O de Campo d Ourique, de infantaria nº 16, foi construido no começo deste século. O de Vale de Pereiro, de caçadores nº1. O da Cruz dos quatro Caminhos, do regimento de artilharia nº1. O da Graça, de infantaria nº 10, no convento que pertenceu aos eremitas de Santo Agostinho. O do castelo de S. Jorge, de caçadores nº 5. O do Carmo, da guarda municipal, no convento que foi dos frades carmelitas.

Edifícios importantes

Os outros edifícios principais da cidade ainda não mencionados são os seguintes. O da Escola Politecnica, majestoso palácio que está em reconstrução. Era o convento dos jesuítas da Cotovia, onde o marquês de Pombal fundou, depois da extinção desta, ordem o Colégio dos Nobres, que a seu turno foi extinto e substituido por aquela escola. O antigo edifício foi destruido por um incendio em 1843.

O Palácio das Cortes era o Convento de S. Bento da Saúde, de monges beneditinos, construido em 1598. É um edificio imenso e todavia não chegou a concluir-se. As duas salas dos pares e deputados foram construidas em 1834. Também se acha acomodado nele o Arquivo Real da Torre do Tombo, onde se guardam muitos documentos importantes e preciosidades históricas e artisticas, entre as quais citaremos a famosa Bíblia dos Jerónimos, dada por el rei D. Manuel ao mosteiro de Belém, levada por Junot para França em 1807 e restituida depois da paz geral, mediante a gratificação de quarenta mil cruzados, para a viúva daquele general que a possuía. Vieram seis volumes, sendo sete.

O do Banco de Portugal, na praça do Pelourinho, é propriedade da câmara municipal, que ocupa, para as suas sessões e secretaria, o palácio da praça do Comercio, que forma o ângulo do ocidente. A grande sala das sessões da câmara é ornada de ricos panos dr Arrás, de um quadro de Nossa Senhora da Conceição, feito por José da Costa Negreiros e três quadros com os retratos de corpo inteiro del rei D. João VI, del rei D. Pedro IV e da rainha, a senhora D. Maria II.

O da Alfandega Municipal, outrora terreiro publico sobre o Tejo, deposito e mercado de cereais, é um grande e majestoso edifício, mandado fazer em 1766 por el rei D. José I.

O da Cordoaria, á Junqueira, edificado por D. Maria I, é vastissimo. A sala ou armazem aonde se fazem as amarras e cordas, tem duzentas braças de comprimento.


O da Fábrica do Tabaco era o convento de S. Francisco de Xabregas, de franciscanos. É um grande edificio de arquitectura mui regular, situado junto ao Tejo, a pouca distancia das barreiras da Cruz da Pedra. Como estabelecimento fabril é coisa magnifica.

O da Imprensa Nacional só é digno de menção pelo estabelecimento tipografico que encerra, que está perfeitamente organizado e servido; e o da Casa da Moeda pelas preciosidades que aí se guardam.

O da Academia Real das Ciências era o convento de Jesus, de religiosos da terceira ordem de S. Francisco. Foi fundado em 1615, destruido pelo terremoto e reconstruido depois. Está nele o museu nacional e galeria de pinturas que devem ser transferidos para o edifício da escola politechnica, logo que estejam prontas as salas para os receber.

O novo Matadouro, que está em construcção na Cruz do Tabuado.


Não possui esta cidade palácios particulares que se possam chamar sumptuosos. Todavia alguns tem, que sobresaem por beleza de arquitectura ou por suas proporções grandiosas ou pela riqueza dos seus aposentos. Sob este triplice ponto de vista, as melhores residencias são as dos senhores duques de Palmela, ao Calhariz e na rua da Fabrica da Seda; condes do Sobral, ao Calhariz; marquês de Viana, ao Rato; conde de Farrobo, na rua do Alecrim; Bessone, na rua do Ferregial de Cima; marquês de Castelo Melhor, ao Passeio Publico; marquês de Pombal, na rua das Janelas Verdes, habitado por sua majestade a imperatriz; marquês da Ribeira Grande, de Fonseca e do visconde da Junqueira, todos três na rua da Junqueira; marqueses de Abrantes, na calçada do mesmo nome; visconde de Porto Covo de Bandeira, na rua de S. Domingos á Lapa; baronesa de Barcelinhos, ao Chiado; Amaral, na rua da Fabrica da Seda; conde de Redondo, a Santa Marta; marquês de Lavradio, no Campo de Santa Clara; marquês de Niza, a Xabregas; e condes de Valadares, ao Carmo.


Conta Lisboa muitos estabelecimentos literarios e de instrução publica, dos quais enumeraremos os principais. Escola politechnica; escola do exercito; naval; de construção naval; medico cirurgica; de farmacia; veterinaria; do comercio; conservatorio real de Lisboa; instituto industrial; instituto regional de agricultura; três liceus; colegio militar; colegio dos aprendizes do arsenal academia; das belas artes; academia real das ciências.

Bibliotecas

E as seguintes bibliotecas: Biblioteca publica, no convento de S. Francisco, que foi de franciscanos, instituida pela rainha D. Maria I, cuja estátua em mármore de Carrara, feita segundo o modelo de Joaquim Machado de Castro, por Faustino José Rodrigues e Feliciano José Lopes, adorna uma das suas salas. Encerra mais de cento e quinze mil volumes impressos, dez mil manuscritos, entre uns e outros muitas obras raras e ricas e um medalheiro com mais de vinte e cinco mil medalhas. Biblioteca da academia, também publica, no convento de Jesus, com cinquenta mil volumes. Biblioteca de S. Vicente, no convento deste nome, ao qual pertencia, contém uns vinte e dois mil volumes. Pertence actualmente aos patriarcas de Lisboa. Biblioteca da marinha, no edifício do respectivo arsenal, com uns onze mil volumes. Biblioteca das Necessidades, fundada por D. João V, no convento de Nossa Senhora das Necessidades dos congregados de S. Filipe Nery, contigua e fazendo parte do paço real do mesmo nome. Contém uns trinta mil volumes. Biblioteca da Ajuda, era a antiga livraria real, consta de uns vinte e oito a trinta mil volumes. A dos Paulistas, no convento deste nome e pertencente á sociedade Promotora da Industria. Além destas, há outras ainda em diversos estabelecimentos de instrução e em repartições publicas e muitas particulares ricas e copiosas.

Museus

Museus, além do nacional do das Necessidades, e da fundição do Campo de Santa Clara, de que já falámos, há o da escola politecnica, o da marinha, no arsenal, o arqueologico, da biblioteca publica, o de Benfica, de sua alteza real a senhora infanta D. Isabel Maria; o dos marqueses de Angeja, na rua da Junqueira; o do senhor conde de Tomar; e varios outros mais particulares.

Jardins botanicos contam-se o da Ajuda, o de Jesus, da academia real das ciencias e o de S. José, da escola medico cirurgica.

Cemitérios

São sete os cemitérios. O de Nossa Senhora dos Prazeres e o do Alto de S. João, povoados de ricos mausoleos e plantados de árvores e flores, são os melhores. O da Ajuda, é também arborizado, mas tem poucos túmulos. O dos Ciprestes, pertencente aos ingleses, que nele têm a sua capela, possui muitos e bons mausoléus. O da Boa Morte, dos alemães, é pequeno; assim como o de S. Luís, dos franceses; e o dos judeus.

Castelo


Lisboa conserva poucas antiguidades, além das que vão citadas. Entretanto é importante e digna de atenção a cidadela mourisca e os restos do paço dos reis moiros, no castelo de S. Jorge. Ainda aí se vê a porta onde se entalou Martim Moniz para facilitar a tomada da cidade. Sobre a porta está a sua cabeça em marmore, mandada ali pôr por D. Afonso Henriques, A parte moderna do Castelo, onde está a bateria, prisões, casa do governador, etc. acha-se aformoseada com muito arvoredo e flores. Restam tambem algumas torres e pedaços da muralha del rei D. Fernando, em diferentes pontos da cidade- Na parede de uma casa a Madalena estão embebidas umas lapidas com inscrições romanas, encontradas em escavações.

Lisboa é iluminada a gaz desde o ano de 1849. Possui muitos e bons cafés, boas hospedarias e casas de pasto, varias casas de assembleia, de que é principal o Club Lisbonense; muitos estabelecimentos de carruagens publicas e alguns do banhos; grande numero de fabricas, laboratorios e gabinetes de física, numerosas companhias de comercio e de navegação, etc. A sua população, incluindo Belém, ascende hoje a trezentas mil almas.

Feiras

As suas principais feiras são fora da cidade. Dentro limitam-se a simples feiras de arraial, devendo contudo mencionar a classica feira da Ladra, que se faz todas as terças feiras no Campo de Santa Anna e immediações  e na qual se vende todo o genero de objectos usados e alguns tambem novos e gado cavalar. Das de fora a mais notavel e concorrida é a que se faz no Campo Grande em Outubro e dura quinze dias. Hoje está em grande decadencia pelo feliz resultado das comunicações faceis. Pela Pascoa do Espirito Santo, ha em Sacavém uma feira importante em gados e neste mesmo artigo tambem são de importancia a do Lumiar, em Junho, a da Agualva, em Maio e a de Nossa Senhora da Luz, em Setembro. No primeiro domingo de cada mês ha mercado de gado junto ao chafariz do Campo Grande.

Arrabaldes


Os arrabaldes de Lisboa são formosos, apesar de que os montes sejam em geral despidos de arvoredo, por serem quase todos terras lavradias. Os Vales porém são deliciosos, pelas muitas quintas de regalo e bonitas casas de campo que os povoam. Os mais frequentados e mais belos são ao norte Benfica, onde sobressaem as ricas quintas e palacios da senhora infanta D. Isabel Maria, dos senhores marqueses de Fronteira, dos senhores condes do Farrobo e a que pertenceu á falecida viscondessa da Regaleira. Queluz, onde se ergue um grande palacio real com magnificas salas e com a maior e mais sumptuosa quinta de regalo que ha em todo o reino, obra del rei D. Pedro III. No palacio nasceu e morreu o senhor D. Pedro IV. Belas, notavel pela quinta e palacio antiquissimo dos senhores condes de Pombeira. Lumiar, com a formosissima quinta e palacio dos senhores duques de Palmela. Nossa Senhora da Luz, aonde está o colegio militar, cujo edificio mandou fazer para hospital a infanta D. Maria, ultima filha del rei D. Manuel. Ao ocidente, Pedrouços, com uma bela quinta e palacio dos senhores duques de Cadaval ; Caxias, com um pequeno palacio real e quinta, em que avulta uma soberba cascata e grandes jardins; Oeiras, celebre pelas magnificas quintas e palacio do senhor marques de Pombal. Ao oriente, Grilo, com o palacio e uma linda quinta dos senhores duques de Lafões; Chelas, com um antiquissimo e grande mosteiro de conegas regrantes; Poço do Bispo, com o palacio e quinta patriarcal; Olivais e Sacavem, com muitas quintas particulares e um convento de freiras.



Os subúrbios e termo de Lisboa produzem muitos e excelentes trigos e outros cereais; grande quantidade de batatas e cebolas, de que se faz importante exportação; bem como de laranjas e outras frutas; são mimosos de todo o genero de hortaliças, legumes, frutas, criação e caça. O Tejo e a vizinha costa do mar abastecem a cidade de infinita variedade de pescado, que também exporta.

Ilustres

Lisboa, finalmente, tem sido berço de muitos e mui insignes varões, que a têm ilustrado e servido o país com honra e gloria. O seu catalogo é imenso. Nomearemos tão somente os que por mais eminentes nos vêm agora à memoria. O papa João XXI, nascido e baptisado na freguesia de S. Julião, chamava-se antes de subir ao solio pontifício Pedro Julião, e como escritor era conhecido com o nome de Pedro Hispano. Santo António, nascido e baptizado na paroquia da Sé. El rei D. João I, o defensor da independência de Portugal e o plantador do nosso poder na África. João das Regras, o celebre jurisconsulto que persuadiu, com a sua eloquência, os três estados do reino reunidos em cortes a pôr sobre a fronte do mestre de Avis, D. João I, a coroa portuguesa que D, João I, de Castela disputava á força d armas. D. Duarte de Menezes, terceiro conde de Viana, um dos maiores heróis das nossas empresas de África, O infante D. Pedro, duque de Coimbra, filho del rei D. João I, que com tanta sabedoria e justiça e com geral aceitação dos povos regeu Portugal durante a menoridade del rei D. Afonso V, seu sobrinho. D. Francisco de Almeida, primeiro vice rei da Índia; e D. João de Castro, quarto vice rei do mesmo estado e que são duas das nossas maiores glorias militares. Luís de Camões, príncipe dos poetas da península e um dos primeiros épicos do mundo. D. Fr. Bartolomeu dos Mártires, arcebispo de Braga, um dos mais sabios e virtuosos prelados que têm florescido neste reino e que tanto lustre lhe deu quando foi assistir e tomar parte no concilio tridentino, António Ferreira, um dos nossos mais distintos poetas e autor da primeira tragédia que se compôs na peninsula hispanica e a segunda que apareceu no orbe literario. D Francisco Manuel de Melo, tão elegante na poesia como na prosa. O padre António Vieira, o mais eloquente e energico de todos os nossos oradores sagrados e também o mais elegante, discreto e primoroso de todos os nossos escritores. Francisco Manuel do Nascimento, mais conhecido pelo nome de Filinto Elysio, distinctissimo poeta e prosador, autor de muitas obras estimadissimas e restaurador da boa linguagem portuguesa. E, finalmente, o senhor Alexandre Herculano, o nosso primeiro historiador.


Por Ignacio de Vilhena Barbosa


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Pelo Censos 2011 Lisboa conta com 545 245 habitantes

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