sábado, 12 de fevereiro de 2011

História: A Sé de Viseu e outros monumentos da cidade - imagem antiga de 1841




História
Viseu
A Sé de Viseu e outros monumentos da cidade



Sé de Viseu, imagem antiga de 1841

Divide se a cidade em dois distritos, oriental e ocidental cada um com uma parochia, ambas da invocação de Nossa Senhora da Conceição. Esta divisão é moderna; antes dela havia na cidade três freguesias que eram a sé, S. Martinho e S Miguel.


A sé está edificada no centro da povoação e na parte mais alta dela. Atribui-se a sua fundação ao conde D. Henrique e a sua mulher a rainha D. Thereza. Pelos anos de 1341 o bispo D. João fez lhe varias obras, entre outras principiou um claustro do lado de este. O bispo D. Diogo Ortiz de Vilhegas reedificou inteiramente o coro e a abobada do templo, que é magnifica. Segundo consta de uma inscrição lapidar acabou-se esta obra em 1513. O mesmo prelado sagrou a igreja no ano de 1516.

O claustro de architectura dórica, foi construido em 1534 pelo bispo D. Miguel da Silva, que faleceu em Roma, sendo cardeal. No logar onde está este claustro existiram umas casas, que, conforme refere a tradição, serviram de paços aos Reis de Leão e das Astúrias, quando vinham passar algum tempo a Viseu, e nas quais tambem residiram o conde D. Henrique e a rainha D. Thereza.

A sacristia encerra excelentes quadros do nosso grande pintor Grão Vasco, e são os seguintes: o da descida do Espírito Santo, e o de S. Pedro, ambos de grandes dimensões, vendo-se o príncipe dos apóstolos por singular anacronismo, trajado em vestes pontificais; e dois quadros pequenos, um de S. Jeronymo, em meio corpo, e outro de Santo André e mais um dos apóstolos. Alem destes adornam a sacristia outros painéis, que os entendidos presumem ser obra dos discípulos daquele exímio artista.

Do mesmo Grão Vasco há um quadro de vastas proporções no altar chamado da Porta do Sol, o qual representa a paixão de Jesus Cristo no Calvário. Na sala do capitulo existem quatorze painéis do dito mestre, de seis palmos d' altura e três de largura, representando, sete d'elles, a historia de Nossa Senhora desde a Anunciação até à fugida para o Egipto; e outros sete os passos da vida de Cristo desde a Cêa ate ao Pentecostes.

A sala do capitulo foi edificada pelo cabido, sede vacante no anno de 1721, no próprio local, onde habitou S. Theotonio, no meiado do século XII, durante o tempo que, com o titulo de prior, governou a sé de Viseu.

Não se sabe, como já dissemos, a época precisa em que foi erigido o bispado de Viseu. Mas é fora de duvida, que o estava no meado do seculo VI, pois que no terceiro concilio bracarense, celebrado no ano de 571, se faz menção do bispo Remisol, com o titulo de prelado de Vizeu. Com a invasão e conquista dos árabes interrompeu-se por vezes a serie dos bispos desta igreja. Pretendeu restaural-a a rainha D Thereza, e foi então nomeado bispo D. Odorio; porem não teve efeito esta nomeação por se oppôr o bispo de Coimbra com diversas razões que alegou.

O que não logrou D. Thereza, conseguiu o seu filho el rei D Affonso Henriques, no ano de 1144, sendo elevado á cadeira episcopal de Viseu o mesmo D. Odorio. Desde então tem continuado até hoje a serie destes prelados com algumas interrupções de sede vacante, uma das quais durou dezanove anos no reinado de D. João V. O bispado de Viseu foi suffraganeo, nos seus primeiros tempos, da cadeira metropolitana de Braga; depois da de Mérida, e desde o tempo de D. Afonso Henriques outra vez da de Braga. Na serie dos seus bispos contam-se três cardeais, D. Jorge da Costa, o infante D. Afonso, filho d elrei D. Manuel e D. Miguel da Silva.

Os outros edifícios principais da cidade religiosos e civis são a igreja da misericordia; o hospital reedificado modernamente; o paço episcopal; o antigo seminário começado pelo bispo D. Nuno de Noronha nos fins do século XVI; o velho quartel militar reconstruído á custa do povo nos princípios d' este século; duas torres de origem romana de que ao diante falaremos; a casa da camara, reedificada depois do incendio, que a destruiu em 6 d'Agosto de 1796; a egreja de S. Miguel da Fetal, extramuros, que ainda há pouco era freguesia; a capela de N. Senhora da Conceição, no Rossio de Santo António, ou campo da Feira; a igreja de S. Martinho, outrora parochial; o mosteiro do Bom Jesus de freiras beneditinas, ainda hoje habitado, começado em 1560 pelo bispo D. Jorge d'Ataide, e concluído em 1592 pelo bispo D. Nuno de Noronha; e os edifícios dos três extintos conventos, que vamos mencionar. O convento de santo António, que foi de frades capuchos, teve a sua fundação em 1635; e hoje serve de quartel ao regimento de infantaria nº 14. O convento de Nossa Senhora da Assumpção, que pertenceu aos congregados de S. Filipe Nery ,foi construído em 1688. Acham-se ao presente nele o seminário episcopal e o liceu. E nos arrabaldes o convento de S. Francisco d'Orgens, outrora de capuchos, foi fundado em 1407, e feito inteiramente de novo em 1749. O convento e cerca são actualmente propriedade particular; e a igreja é freguesia suburbana.

A igreja de S. Miguel do Fetal é muito antiga, e parece que foi a primitiva sé de Viseu. Tem tido diversas reedificações, sendo a ultima no ano de 1735, correndo com as despesas o cabido, sede vacante.

Na capela mor existe um túmulo, que mostra bastante antiguidade, e cujo epitaphio diz que ali se acha D. Rodrigo ultimo rei dos godos. Antes da reconstrução do templo em 1735 o letreiro era assim concebido: Hic requiescit Rodericus rex got torum. Por occasião destas obras pozeram- lhe novo epitaphio que ainda ali se vê, e é como segue:

Hic jacet aut jacuit postremus in ordino regum Gottorum ut nobis nuniia fama refert
Aqui jaz ou jazeu o uttimo na serie dos reis godos segundo nos refere a mensageira fama.

Não sabemos a razão porque se acha ali este mausoleo, nem a época em que foi construído. Mas o que dão por certo historiadores conscienciosos e investigadores é que D Rodrigo morreu na batalha do Guadalete, que poz fim á monarchia dos godos, e deu principio ao dominio árabe na península.

Sendo pois uma pura fábula a peregrinação d' este soberano por terras de Portugal, aquele túmulo e um monumento mentiroso.

Como uma antiquissima tradição popular contava que D. Rodrigo, tendo escapado da batalha, vivera anos como ermitão de Nossa Senhora da Nazareth, e depois fora morrer a Viseu, talvez que alguém, acreditando piamente na tradição, e vendo na velha igreja de S Miguel algum mausoleo sem inscrição, inscrevesse nele o primeiro dos referidos epitaphios, julgando que não fazia mais que esclarecer um ponto da historia. Mas também é possível, que em vez de erro, fosse fraude para autorizar a tradição e dar assim mais nobreza á cidade.

Viseu tem algumas boas praças, e dois bonitos passeios. A principal daquelas pelos edifícios, que a cercam, é a que se estende em frente da Sé e do paço episcopal. A alameda do Rossio de Santo Antonio é um lindo e extenso passeio.

Tem esta cidade um teatro, onde representam curiosos, ou alguma companhia ambulante; um club, intitulado associação viziense, em que se dão alguns bailes; e dois jornais políticos, o Viriato e o Viziense. Possui um bom cemitério, construído há poucos anos junto ao hospital civil.

Das muralhas de Viseu restam poucos vestigios, a não ser uma lapide com uma inscipção, que comemora a conclusão desta obra em 1472, e três arcos das antigas portas, que teem o nome do santo que a piedade dos vizienses ali collocara.

A lapide ainda se conserva da parte de fora do Suar.

As outras antiguidades de Viseu são: a Cava de Viriato, as torres romanas, e a casa chamada da torre na rua da Cadêa.

A Cava de Viriato está próxima da povoação, e era, como fica dito, o assento da antiga cidade de Vacca.

A tradição refere do seguinte modo o seu principio. Informado o pretor romano Caio Negidio de que o pretor Cláudio Unimano, tinha sido desbaratado no Alentejo pelos lusitanos comandados por Viriato, apressou-se a invadir a Beira, levando tudo a ferro e a fogo, para assim fazer uma diversão ao inimigo. Viriato não tardou em acudir à província invadida, mas achando os romanos muito bem entrincheirados em uma planície junto ao sitio onde está Viseu, cercou- os resolvido a rende los pela fome ou a obriga los a combate fora da circunvalação, que os defendia. Depois de algum tempo de cerco, o pretor Gaio Negidio saiu a oferecer batalha, mas foi vencido caindo o seu arraial em poder dos lusitanos.

Conservou Viriato o campo entrincheirado do inimigo. Alteou-lhe mais os muros de terra, que o cercavam; profundou-lhe os fossos e ahi se fez tão forte, que, mais tarde, vindo sobre ele os romanos com poder muito superior ao seu, não conseguiram vence lo nem desaloja lo daquela posição.

É pois a este campo que se deu o nome de Cava de Viriato, e no qual o grande capitão dos lusitanos fundou a cidade de Vacca, ou depois da sua morte a começaram os romanos.

No reinado de D. João I ainda a cava estava vedada e fechada com uma porta, tendo dentro uma ermida dedicada a S. Jorge, onde por deixa e disposição testamentaria do infante D. Henrique, se cantava missa em todos os sabbados, e no dia do santo se fazia uma procissão com assistência do cabido, e muita concorrencia de povo. A capela arruinou- se, e esta pratica acabou. No ano de 1461 tomou posse da cava o cabido da sé.

Mandando el rei D. João V medir a cava em 1728, achou se que tinha de circumferencia três mil e cinco passos, e os muros setenta e cinco palmos d'altura e quarenta de largura na parte superior. Posto que a cerca estivesse em muitos sítios destruída, a ponto de custar a distinguir-lhe os vestígios, mostrava ter tido a forma oitavada, com quatro portas ou aberturas, duas ao norte e duas ao sul.

Ordenou aquele soberano que se conservasse com o maior cuidado o que restava de tão precioso monumento. Porém nos seguintes reinados esse cuidado foi afrouxando ate acabar de todo. Então começaram os lavradores e habitantes das vizinhanças a arrancar o que o tempo e os homens tinham poupado, uns nivelando com o arado fossos e muros, e outros levando dali os restos da pedraria dos edifícios da antiga Vacca.

Em 1818 mandou a câmara de Viseu pôr marcos em torno da cava, tanto exterior como interiormente. Porém os devastadores ainda continuaram a assolar o monumento de Viriato. Dos muros ainda existe alguma coisa; mas dos fossos que eram cheios d'agua, só resta um pedaço do lado ocidental, actualmente chamado o poço da cava.

As torres romanas foram mandadas construir, segundo se diz pelo cônsul Junio Dccio Bruto, sendo architectos delas dois irmãos chamados Frontonio e Flacco. Pretendem alguns escritores que outrora se via numa das torres uma lapide com estes dois nomes, e na outra torre as águias romanas.

Arruinaram-se estes monumentos, reduzindo- se a muito menor altura que a primitiva. Uma delas está no fundo da rua do Relógio. A outra, tendo sido acrescentada e reparada é a casa da cadêa. Desta fez prisão do Aljube o bispo D. João Gomes d'Abreu falecido em 1482.

A casa da torre na rua da Cadêa pertenceu ao infante D Henrique, duque de Viseu, que nela habitou por vezes. Ainda ali se vêem por cima de uma janela gothica, as armas da dinastia d'Aviz.

Em 1818 descobriu-se junto á cidade um curioso objecto archeologico do qual não se conserva mais que a memoria. Era um sepulcro romano encontrado numa quinta por uns trabalhadores na occasião de cavar. Tinha sete palmos de comprimento e quatro d' altura. Cobriam o sarcophago três pedras de granito. Na do meio lia-se a inscrição que segue:

Maelo Bo
Vti F Tap
Anno LX H
SESTT Levis
Fili TC

Não aparecendo ali quem apreciasse e salvasse esta antigualha, os mesmos trabalhadores vieram por fim a fazel-a pedaços.
(continua)
Mais Viseu em Antikuices


Portugal antique illustration, pictures, images, photos
Viseu, História e imagens antigas

Sem comentários:

Enviar um comentário