quinta-feira, 9 de junho de 2011

História: Évora - Geraldo Sem Pavor e o Templo Romano (imagem 1837)


História
de
Évora

A conquista de Évora por Geraldo Sem Pavor

O Templo Romano de Évora (imagem 1837)


A cidade de Évora, capital da província do Alentejo, está assentada quase no meio desta fértil província, em posto um pouco levantado, o que parece dominar os vastos campos que a cercam por toda a parte até irem parar em quatro serras, com que a natureza cercou a larga distância aqueles planos extensos; da parte do oriente a serra d'Ossa, do sul a de Portel e Viana, do norte a de Arraiolos e do ocidente a de Montemuro.

É antiquíssima esta cidade, mas sua origem está envolvida na escuridão dos tempos. Contam alguns historiadores que os Celtas vindos das Gálias à Espanha a fundaram no ano de 759 antes da vinda de Cristo, quase ao mesmo tempo em que Roma fora fundada (ano 747). Plínio e outros autores romanos na verdade concordam em pensar que Évora fora nos tempos mais remotos habitada pelos Gaulos e Fenícios; porém quando a história desta cidade começa a aparecer com o carácter de verdade, é só nos últimos tempos da república romana, em que Viriato e Sertório lhe deram grande nome; o primeiro ganhando á sua vista uma de suas primeiras e mais assinaladas vitórias contra os romanos; e o segundo cercando-a de muralhas, enobrecendo-a de edifícios, e assentando nela a sua habitação, coisa de 84 anos antes da vinda de Cristo.

Sertório proscrito poг Sylla, e fugindo á sua tirania, veio achar asilo e protecção entre os habitantes da Lusitânia, então em contínua guerra com os romanos, opondo- se á frente daqueles se arvorou em seu chefe contra o partido agressor, a quem com os soldados lusitanos muitas vezes derrotou.

Nos intervalos da guerra ocupou-se Sertório em cercar Évora de fortificações á romana; para a abastecer de água fez construir um magnifico aqueduto de que ainda hoje se vêem restos; e edificou para si uma casa onde depois se fez o convento das freiras do Salvador; as muralhas as mandou derrubar elrei D. Fernando, e levaram três anos a demolir.

No ano 59 antes de Cristo, vindo Júlio César à Lusitânia, restituiu a Évora o direito de município latino, dando-lhe maior extensão; e lhe fez outras concessões, pelo que tomou a cidade o nome de Liberalitas Julia (liberalidade de Júlio César); porém os romanos continuaram a dar-lhe o nome de Ebora ,que lhe viera Celtas Eborões, a quem, como acima dissemos, se atribui a sua fundação; e o qual ainda hoje conserva com pequena alteração.

Decaído o império romano, se apoderarão os godos da Lusitânia, e debaixo do domínio destes abraçou Évora a fé cristã pela pregação de S. Manços, que foi o seu primeiro bispo.

Na invasão da Hespanha no ano de 715 depois de Cristo, entrou Évora em poder dos mouros, e em seu domínio se conservou por mais de 400 anos até tempo de D. Afonso Henriques, em que foi tomada um cavaleiro português, por nome Geraldo sem pavor, pela maneira seguinte.

Como Geraldo Sem Pavor conquistou Évora

Era Geraldo homem nobre, que havia bem servido a elrei, mas tendo cometido um crime que punha em risco sua vida, se lançou com muitos outros hominizados e gente perdida no Alentejo, onde fazendo aliança com os mouros, edificou um castelo no sítio que hoje se chama Castelo Giraldo, e dali saía a fazer correrias sobre as terras de cristãos, pelo que seu nome era muito temido. Não lhe sofrendo todavia a grandeza de seu animo continuar nesta vida desregrada, lembrou-se de fazer a el-rei um serviço tal, que por ele merecesse obter o seu perdão. Nenhum lhe pareceu mais próprio a esse fim do que a conquista da cidade de Évora, que elrei muito desejava ganhar a seu poder. Como a praça era forte, bem guarnecida e cautelosamente vigiada, só por surpresa e ardil poderia ser levada. Eis aí como ele se houve.

Foi á cidade, e tratando com o alcaide dela se ofereceu para, por meio de um ardil lhe entregar nas mãos elrei D. Afonso Henriques, se para isso lhe desse um socorro de gente bem montada. Deu o mouro crédito ás suas palavras, pelo muito que desejava ver-se livre de tão perigoso inimigo, e para assentarem mais de espaço no negócio, o conservou dois dias consigo na cidade. Valeu- se Geraldo deste tempo para examinar miudamente as muralhas, vigias, e tudo que era relativo á defesa da cidade. Despedido do alcaide foi concertar com os seus a empresa, a que todos acederam de bom grado na esperança de se verem assim restituídos a suas casas e famílias. Armados e providos das coisas necessárias ao intento, saiu Gerardo do seu castelo por caminhos opostos á cidade, para não despertar a desconfiança dos mouros; mas tendo bem anoitecido, se fez na volta de Évora, e chegando a coisa de meia légua daquela parte onde agora está fundado o mosteiro de S. Bento, emboscou os seus detrás de um serro entre matas que ali havia; e lhes mandou que o aguardassem em silêncio até que voltasse. Encaminhou-se então só e coberto de ramos de árvores, para não ser visto, a uma torre de atalaia estava no campo fora da cidade, e cuja guarda era cometida a um mouro que nela residia com sua filha, para dali fazer aviso de rebate para a cidade, quando na campanha apareciam cristãos. Tendo chegado á torre sem ser pressentido, começou a trepar a ela com a maior ligeireza, por meio de umas estacas pontiagudas de que ia provido, e que cravava entre as pedras. Ganhou assim a janela da vigia. onde encontrou adormecida a moura a quem eu pai nessa noite havia encarregado da sentinela. Contente deste primeiro sucesso, arrojou a moura sobre os penedos em que a torre estava edificada, com tal ímpeto que logo ali perdeu a vida; e dirigindo-se ao pai que estava entregue ao sono, lhe cortou a cabeça, e com ela pendurada da mão, tornou a descer, e caminhou direito aos seus. Apartou 120 de cavalo, para que fossem pela parte do Espinheiro fazer uma trilha como se fossem inimigos que andassem no сamро; e ele com o resto da gente foi novamente á torre e fez com um facho aceso o sinal de rebate para a cidade. Não tardou muito que o alcaide mouro não saísse com a principal gente de armas para o lado onde os seus descobridores lhe haviam dito que andavam os cristãos, Geraldo correndo á porta da cidade, pouco depois do alcaide ter saído, se apoderou dela, e aproveitando-sе da escuridão da noite matava quantos mouros encontrava pelas ruas e cerrava os ferrolhos das portas para não poderem acudir os que estavam dentro; e com tanto valor se portaram todos, e tanto desembaraço, que não perceberam os mouros que tinham o inimigo dentro da cidade, senão quando este já estava senhor dela. Ainda contudo os atalaias poderam fazer ao alcaide sinal do engano; mas quando este dando logo volta á cidade, quis entrar nela, Geraldo e os seus, que ás lançadas lho defenderam, até que chegando os 120 de cavalo tomaram os mouros pelas costas e completaram a sua derrota, sendo poucos os que poderam escapar-se. Geraldo fez logo sair da cidade os mouros que se achavam encerrados nas suas casas, excepto alguns que preferiram ficar nela sujeitos ás nossas leis, e assim viveram e seus descendentes até ao tempo d'elrei D. Manuel, que os mandou sair do reino.

Mandou Geraldo aviso do que se passara a elrei, o qual ficou tão satisfeito desta empresa, que além de lhe perdoar, e aos seus, admitindo-os á sua graça, deu a Geraldo a alcaidaria da praça, e lhe fez outras mercês, assim como aos que mais se haviam distinguido. E para que os mouros não tornassem a pôr a cidade em aperto, mandou para ela os cavaleiros da nova ordem, que hoje se chama de Aviz, assignando-lhes aquela parte da cidade que ora chamam a Freiria.

Évora foi por muitas vezes a corte dos nossos Reis, e entre estes pode citar-se D. João III como о que mais contribuiu para seu aumento e conservação de seus monumentos, mandando fazer reparos no aqueduto de Sertório.

O Templo Romano de Évora

O templo de que neste número apresentamos a estampa, é uma das mais belas ruínas das antiguidades romanas; não se sabe de certo a data da sua fundação; alguns o dizem obra de Sertório; porém como a arquitectura se achava então em grande atraso entre os romanos, seria necessário nesse caso acreditar que o plano da obra fora traçado por artistas gregos; porém é mais natural que a sua construção fosse do tempo dos imperadores. A parte que coroa o entablamento, é evidentemente obra muito mais moderna; tem a forma das fortificações orientais, e sem dúvida é uma adição que lhe fizeram os mouros; a qual apesar de não carecer de alguma elegância, difere contudo de tal forma do resto do edifício, que fere os olhos dos соnhecedores da arte.

Algumas inscrições latinas fazem acreditar que este templo fora consagrado a Diana, e é isto que o faz atribuir a Sertório, porque sabido é que este general para dominar no espírito dos povos, abusando da sua credulidade, se dizia muito favorecido daquela deusa, de quem recebia inspirações por meio de uma corça. A frente do templo é ornada de seis coluna de granito da ordem coríntia, as quais pouco têm sofrido do tempo e das mãos dos homens; o resto do edifício conserva-se em muito estado; o que faz admiração atendendo a que não terá menos de 1800 anos de existência. Pode pensar-se que no tempo dos mouros ele fora transformado em fortaleza.

Desgraçadamente ainda não há muito tempo que este edifício, talvez a melhor relíquia da antiguidade em Portugal, servia de matadouro do gado para os аçougues da cidade, e para outros usos igualmente degradantes.



38° 34' N 07° 54' W
Évora
Portugal




Portugal antique illustration, pictures, images, photos
Évora, História e Imagens Antigas

Sem comentários:

Enviar um comentário