segunda-feira, 13 de junho de 2011

História: IGREJA E CONVENTO DE S. FRANCISCO em ÉVORA (III)



História


ÉVORA 

IGREJA E CONVENTO DE S. FRANCISCO

3ª parte 

Conclui finalmente o nosso Jeremias franciscano:

«Morto este rei, ficou seu filho D João II, e acabou de nos tomar o mais e nos tirou a vista do Rocio, e nos pôs no que agora védes; e porém quem viver verá que os mortos, que isto deram a S. Francisco, hão-de clamar e pedir justica a Deus. Neste tempo tinha el rei grandes fadigas de guerra e coisas que a seu tempo parecerão, que tambem nestas casas onde se liam as escripturas de Deus, se deu sentença de morte com que degolaram o duque Bragança; e agora querem fazer festas, que se hão-de tornar em pranto; e quem viver verá. Dizem os padres velhos que cada rei que vier há-de tomar seu pouco até que tomem toda a casa, não olhando que foi edificada com licença de S. Francisco e por companheiros santos, onde jazem também muitos letrados e homens santos, não entendendo os castigos e açoutes que lhes Deus dá.»

Tanto se alargou D. João II pelo convento que, segundo afirma o padre Esperança, no aperto em pôs os frades, até oficinas lhes faltavam. Restituiu-lhes, porém, a fim de a transformarem em enfermaria, uma casa que servia de relação.

Diz o autor da memória, que nos estudos, por onde D. Afonso V começara a apropriar-se do convento, se deu a sentença de morte do duque de Bragança. Diverge neste ponto das crónicas contemporaneas, que são concordes em declarar que nos paços do conde de Olivença (onde é hoje a casa do duque de Cadaval) se hospedou el rei, por serem melhores para o verão, e aí foi sentenciado o infeliz duque. 

As festas de que fala são as que se celebraram Évora pelos desposórios do principe D. Afonso com a infanta de Castela em 1490; e os prantos que seguiram tiveram por causa a morte desastrosa do mesmo príncipe em Santarém, oito meses depois, no ano de 1491.

Obteve D. João II uma bula de Alexandre VI, passada a 14 de abril de 1495, confirmando as annexações feitas, sob condição de compensar o convento com as obras mais úteis e necessárias, o que não chegou a cumprir, porque faleceu neste mesmo ano de 1495.

Começando a reinar D. Manuel, achava-se reduzido á ultima extremidade, no material e na extensão, o convento de S. Francisco de Évora. Da grande casa que os frades antecedentemente haviam ocupado não lhes restava mais que o templo em ruinas, a claustra a e as edificações próximas, também em grande parte arruinadas. Da extensa horta, onde outrora podiam espairecer em dilatados passeios, apenas um pequeno quintal junto da portaria, até onde se tinham alargado os jardins dos paços reais. A mão poderosa dos monarcas de quase tudo os privara para aumentar e engrandecer a sua residência predilecta.

Cuidou, porém, o novo rei de melhorar o convento, reedificando o aluido templo, restituindo a cozinha antiga, que estava tambem anexada ao palácio, e fazendo o dormitorio com outras obras de necessidade. Conta-se que em certa ocasião se queixaram os religiosos ao seu real edificador de lhes deixar muito pequenas as portas das celas, e que ele, entrando numa, lhes respondera que por onde cabia um bem podia caber um frade. 

Reedificou-se a igreja nos princípios do século XVI. Destas obras ficou uma curiosa memória no foral que D. Manuel deu á cidade em 1501, e se guarda no arquivo da câmara. Tem no principio um desenho de cores, tosco e imperfeito, que representa a cidade naquela época, e por cima a seguinte epigrafe gótica: «Ebura colonia romana». Aí se vê a igreja S. Francisco, tendo as paredes incompletas com guindaste a indicar as obras que nela se faziam. O foral é tambem escrito de letra gótica em pergaminho, com tarjas e iluminuras.


Neste mesmo reinado, tendo sido cento e oitenta e três anos cabeça de custodia, se reformou o convento de Évora na regular observância por bula pontificia de 7 de julho de 1513. A carta em que D. Manuel o mandou entregar aos observantes foi passada em Lisboa a 22 de julho do dito ano, e apresentada no dia 29 do mesmo mês aos frades pelo licenciado João do Soiro, juiz da cidade, com a intimação de sairem do convento.

Pelas obras e concessões del rei D. Manuel, não se chegaram a separar os dominios reais dos franciscanos, antes permaneceram como antecedentemente, em recíproca dependência. Servia- se a corte da tribuna da igreja por meio de comunicações interiores, e consta que no tempo de D. João III não havia menos de sete portas comuns aos paços e ao convento. Assim continuou tudo até ao tempo de Filipe III de Espanha, que em 1619 deu aos religiosos todo o ferro do palácio para o aplicarem a obras suas. Em 1626 deu- lhes três salas, sendo uma delas o quarto da rainha, que era do lado do Rocio, para o transformarem em dormitorio, e, além disso, o jardim, o laranjal e a agua da Prata.

Aproveitaram-se os frades das concessões, destruindo as grandezas do palácio, e enxertando no convento os mármores, as madeiras e todos os ricos despojos que ali encontraram; de modo que de tão vastos edificios não restam mais que as ruínas de duas galerias.

Do convento já também se não conserva muito. A parte menos arruinada é aquela onde se construiram no seculo XVII os dormitórios, cujas janelas dão sobre a rua do Paço e para o passeio publico. O que daí se segue até á igreja são tudo ruinas. O refeitório, construido por D. Manuel, como se via pelas esferas da abóbada, e que estava contiguo á claustra, foi demolido há quatro anos depois de ter servido de tribunal judicial. Destinara-se o espaço que ocupava e o terreno próximo á construção de um mercado, que não teve ainda principio.

Os restos do convento e dos paços, com a cerca, pertencem boje á câmara. O que passou dos fiéis devotos aos frades, dos frades aos reis, e destes outra vez áqueles, veio afinal, pela sucessão dos tempos, a ser do municipio. Assim se restituiu ao dominio popular aquilo que primeiro pertenceu ao povo. O que as revoluções aniquilaram, o que a ignorância e o desleixo destruiram, isso que a ninguém utilisou, sirva ao menos de persuadir a necessidade de preparar um futuro mais civilizado que os últimos século,s compreendendo, apesar de todas as luzes este em que vivemos.  A. Filippe Simões


38° 34' N 07° 54' W
Évora
Portugal



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