História
Templários
O Fim da Ordem do Templo e o Nascimento da Ordem de Cristo
Pouco depois de rebentar em França a perseguição contra a ordem do Templo, em todos os países católicos onde esta ordem existia, instaurou-se processo contra seus cavaleiros por determinação pontifícia.
Foi convocado em Salamanca um concilio de todos os bispos de Espanha e Portugal a que presidiu o arcebispo de Toledo D. Gonçalo, para inquirirem da vida e costumes dos templários da península.
Em quanto funcionava este tribunal eclesiastico, reconhecendo desde logo el rei D. Dinis que a ruína da ordem do Templo era irremediável, pois que á sua perspicácia não escaparam certas circunstancias que lhe revelaram esse sucesso, que se preparava como negocio ajustado e resolvido entre Filipe IV de França e o papa Clemente V, no momento ou talvez antes da sua elevação ao pontificado, não se limitou a mandar devassar dos usos e costumes dos templários em todas as terras do reino onde tinham residência, o que lhe cumpria fazer em observância da bulia que a este respeito lhe enviara o pontífice. O monarca português, com a prudência e bom senso que distinguiram o seu governo, ordenou que ao mesmo tempo que se inquirisse da vida dos templários, se tirasse uma larga inquirição das jurisdições da ordem, das proveniencias dos seus bens, e das preeminencias que os Reis de Portugal sempre tiveram sobre ela.
El rei D. Dinis não tinha razões de queixa dos templários, antes pelo contrario, estava tão convencido dos bons serviços que o seu reino lhes devia. que por varias vezes. de seu motu proprio lhes deu provas da estima e munificencia régias. Porém, obedecendo como bom filho da igreja ao vigário de Jesus Cristo no que tocava aos negócios espirituais e puramente eclesiasticos, tratou de se premunir com os documentos necessários para se opor quando se apresentasse a ocasião que esperava, ás invasões da curia pontificia nos direitos da coroa portuguesa.
O resultado do inquérito foi favorável o mais possível aos cavaleiros do Templo portugueses. Entre tão grande numero de testemunhas chamadas a juízo, nenhuma os acusou de corrupção nos costumes, nem de heresia ou idolatria. Quanto á primeira culpa livrou-os sem dúvida de caírem nela duas circunstancias especiais que não se davam em França nem em outros paises do centro da Europa. A guerra sem tréguas em que andaram ocupados os portugueses, e, por conseguinte, os templarios, desde a fundação da monarquia e introdução da ordem neste reino até á expulsão final dos moiros para além das praias do Algarve, no reinado de D. Afonso III, não era tempo azado para corrupção de costumes. Este virus introduz-se ordinariamente no corpo social, ou em quais quer congregações de homens, quando o ócio lhes abre a porta, e não enquanto os cuidados e o trabalho lhes entretém o espírito e lhes dá ocupação aos braços.
Quanto ás outras culpas de heresia ou idolatria, ninguém se lembrou de acusar os nossos templários nem apareceu vestígio algum, antes ou depois da extinção da ordem, que pudesse servir de prova da sua cumplicidade em semelhantes delitos.
Tendo-se pois concluído a devassa, sem que os templários portugueses ficassem nela culpados, não permitiu el rei D. Dinis que fossem perseguidos. E quando este soberano, em virtude da extinção da ordem decretada pelo concilio de Vienna em 1312, se viu obrigado a intimar os cavaleiros para saírem das suas residências e largarem os hábitos de templários, a todos deu casas em que se agasalhassem provendo também á sua subsistencia.
Em seguida mandou el rei tomar posse por conta da coroa de todas as casas ou templos, castelos, senhorios e mais bens que haviam pertencido á ordem.
A este tempo já el rei andava em grande contestação com o papa sobre os bens dos templários. O pontífice queria dispor a seu bel prazer daqueles que lhe parecesse, incorporando o restante deles nos da ordem de cavalaria de S. João de Jerusalém. E era esta ultima aplicação a que o citado concilio determinara para a totalidade dos bens dos templários. El rei D Diniz protestando contra semelhante usurpação, e pugnando energicamente pelos direitos da sua coroa, recusava obedecer neste ponto ao papa e ao concilio,
Alegava D. Dinis que a maior parte dos bens da ordem provinham de doações régias, feitas com a condição expressa de se empregarem os seus cavaleiros na defensa do reino contra os moiros, e na conquista dos territórios por eles ainda então ocupados; e que noutra parte era proveniente de legados que, se não tinham aquela clausula explicita, eram todavia ditados pela mesma intenção. Portanto, sendo a ordem extinta, e tendo deixado de existir a intenção, a causa e o motivo pelos quase aqueles bens se haviam desmembrado da coroa, agora lhe pertenciam por direito de reversão.
Insistia o papa em querer que prevalecesse a tudo a sua autoridade e os seus pretendidos direitos; e, tentando pô-los em execução. fez doação do castelo de Tomar ao cardeal Bertrando.
Opos-se D. Dinis a esta doação, e sustentou a luta com a cúria pontifícia ainda por alguns anos. durante os quais entraram nos cofres do estado todos os rendimentos da extinta ordem do Templo.
Enfim, o ilustrado e patriótico soberano português achou um meio de conciliação que mandou propor ao papa e que por este foi aceite, graças á sabedoria, resolução e firmeza com que D. Dinis soube sustentar a dignidade e direitos da sua coroa e a honra e interesses da nação.
Propoz D. Dinis que, em reformação da ordem do Templo em seu reino ,fosse instituída uma nova milícia de cavaleiros de Jesus Cristo, para lidarem também como os da extinta ordem na defensa da fé, na guerra contra os moiros e no acrescentamento da monarquia portuguesa, entregando-se-lhes todos os bens dos templários. E para cortar quaisquer dúvidas e objecções plausíveis que a cúria pontifícia poderia opor, declarava el rei que para colocar a nova ordem na fronteira do seu reino, o mais perto possível de terras de infieis, de modo que ficasse perfeitamente habilitada para desempenhar as obrigações do seu instituto, lhe faria doação do castello de Cástro Marim, excellente fortaleza situada junto á costa do Algarve, defronte de Africa.
Não havia que impugnar tão justa pretenção, O papa João XXII, que então ocupava a cadeira de S. Pedro, expediu a bula de 14 de março de 1319, que instituia a ordem de cavalaria de Nosso Senhor Jesus Cristo em Portugal, na forma proposta por el rei D. Dinis.
Achava-se este monarca nos seus paços da Alcaçova em Santaremc quando chegaram com a referida bula os procuradores que ele havia mandado ao papa para advogarem a sua justiça e os interesses da nação naquela porfiosa demanda.
Cheio de satisfação por ver alfim coroados os seus esforços, el rei D. Dinis celebrou a ceremonia da instituição da ordem com toda a solenidade, em um dia de maio de 1320, na presença de toda a corte e de D. Gil Martins, mestre que então era da ordem militar de S. Bento de Avis, ao qual logo ali investiu no cargo de 1º mestre da nova ordem de Cristo, conforme vinha determinado na bula pontifícia.
Todas as propriedades. senhorios. jurisdições e mais bens que tinham pertencido á ordem do Templo, foram por el rei entregues á ordem dos cavaleiros de Jesus Cristo, menos os rendimentos que entraram nos cofres da coroa durante os oito anos da contestação del rei com o papa, que era o tempo que tinha decorrido desde o ano de 1312, em que a ordem do Templo fora abolida. Desses rendimentos houve el rei solene quitação dada pelo mencionado mestre D. Gil Martins, na qual se declarava que em compensacão deles, recebia a ordem de Cristo a vila de Castro Marim.
Tratou-se imediatamente e com a maior actividade, da fundação do convento dentro do castelo de Castro Marim para habitacão dos cavaleiros de Cristo; e assim que o edificio se achou em circunstancias de lhes dar agasalho, foi a nova milícia ali estabelecer a sua séde.
A maior parte dos cavaleiros templários foram admitidos e professaram na ordem de Cristo, incluindo o seu ultimo mestre D. Vasco Fernandes, que foi feito eommendador de Montalvão e viveu até ao anno de 1323.
Tal foi a origem dessa famosa cavalaria, que tão longe e com tanta gloria levou o nome de Portugal e a luz do Évangelho, que tão celebre se fez na historia universal dos povos pelos descobrimentos arrojados que efectuou ao aceno do imortal infante D Henrique seu administrador e governador.
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