História
Templários
5ª parte
Ordem de Cristo - Descobrimentos
Não são concordes os nossos historiadores sobre o ano em que se levou a efeito a mudança da ordem de Cristo do castelo de Castro Marim para o de Tomar. É tal a divergência de opiniões que até discordam acerca do reinado em que se realizou aquele acontecimento. Dizem uns que fora em tempo de D. Afonso IV, e que a dita ordem apenas estivera em Castro Marim catorze anos, isto é até 1334. Outros põem este sucesso no mesmo reinado mas no fim dele, em 1356, um ano antes do falecimento daquele monarca. Querem outros que se efectuasse a mudança durante o governo del rei D Pedro I, sendo 6º mestre da ordem D. Nuno Rodrigues. Finalmente outros pretendem que isto sucedera no tempo do referido mestre, mas reinando já el rei D. Fernando.
lnclinámo-nos mais para esta ultima opinião, sem que todavia a julguemos incontestável, mas porque se nos afigura ter por si, á mingua de documentos que a todas faltam, maior numero de probabilidades.
Transferida, pois, a cavalaria de Cristo para o castelo e convento de Tomar, aí celebrou o mestre D. Nuno Rodrigues o quarto capitulo geral da ordem.
Nos primeiros anos que se seguiram á mudança da ordem para Tomar, não ocorreu sucesso algum notável com relação a esta cavalaria, exceptuando a eleição do mestre D. Lopo Dias de Sousa, por morte de D. Nuno Rodrigues. Esta eleição, porém, constituiu um caso novo e muito singular, porque D. Lopo não pertencia á ordem, e contava então apenas doze anos de idade. Cessará a admiração que isto deve causar aos nossos leitores dizendo-lhes que tão jovem mestre era filho de D. Maria Telles de Menezes, e por conseguinte sobrinho da rainha D. Leonor Telles de Menezes, que obteve del rei D. Fernando, seu marido tudo quanto a ambição e os seus caprichos lhe ditavam.
Não quis o papa Bonifácio IX aprovar semelhante eleição; mas tanto instou el rei por influencia da rainha, que afinal conveio o pontífice em confirmar a D. Lopo no mestrado de Cristo, sendo a ordem governada durante a sua menoridade por um administrador.
Todas estas resoluções que então pareceram a muita gente, e eram, sem dúvida escandalosas, consideradas porém como um precedente, deram em resultado, mais tarde, um grande esplendor para a ordem e imensos benefícios para o país, o que demonstraremos em lugar próprio. E aprouve também á Providência que a criança escolhida pelo régio favor para mestre de uma ordem de cavalaria tão autorizada e poderosa, viesse a tornar-se digna de tão alto cargo, pela nobreza e elevação do seu carácter, pelo valor do seu braço e pelo seu acrisolado patriotismo.
D. Lopo Dias de Sousa, de quem descendem os duques de Lafões e de Palmela, logo ao tomar posse do mestrado de Cristo, por ter completado os vinte e cinco anos, de idade, deu prova de possuir as qualidades que acima lhe atribuímos.
Achava-se a nação dividida em parcialidades que disputavam com as armas na mão sobre a sucessão da coroa por morte del rei D. Fernando. De um lado estavam os populares, capitaneados pelo mestre de Avis, e tendo hasteada a bandeira da independência e da liberdade; do outro lado achava-se D. João I, rei de Castela, que á frente do seu exercito e de bom numero de fidalgos portugueses, pretendia cingir a coroa de seu sogro, el rei D. Fernando.
D. Lopo não hesitou no partido que devia seguir. Não obstante ter no arraial castelhano sua prima co-irmã a rainha D. Beatriz, pretendente ao trono de Portugal, e a rainha D. Leonor, sua tia, partira de Tomar com um punhado de cavaleiros de Cristo, e veio sobre Torres Novas com o intento de a libertar do poder dos castelhanos. A empresa foi temeraria e o termo dela infeliz, porque declarando-se a vitoria pelo maior numero, o mestre de Cristo e os seus valentes companheiros foram destroçados e levados prisioneiros para Santarém onde jazeram até que o mestre de Avis, já aclamado rei de Portugal, e triunfante nos campos de Aljubarrota, os veio libertar.
Entretanto se as paredes de uma prisão impediram que o mestre D. Lopo se assinalasse nas batalhas que se pelejaram pela independência da pátria, não obstaram a que a ordem de Cristo participasse da gloria que alcançaram as armas portuguesas contra exércitos de Castela. O comendador mor de Cristo e os seus cavaleiros fizeram prodígios de valor memorável batalha de Aljubarrota.
Passados vinte anos ilustrou-se esta famosa milícia numa empresa não menos árdua e gloriosa, mas desta vez coube ao mestre D. Lopo tirar a desforra do impedimento que lhe pozeram quando o dever o chamava a combater pela pátria. Aquela empresa foi a conquista de Ceuta no ano de 1415.
Poucos anos sobreviveu a esta vitoria o mestre D. Lopo, e por sua morte sucedeu-lhe no governo da ordem o infante D. Henrique, duque de Viseu.
O infante não querendo sujeitar-se ao voto da pobreza a que seria obrigado na qualidade de mestre, pois que já todo estava entregue ao estudo da matemática, fantasiava empresas que demandavam avultados cabedais, valendo-se do precedente que se dera com ultimo mestre, durante a menoridade do qual a ordem fora governada por um administrador, obteve pontífice que o confirmasse no governo dela com o titulo de governador e administrador em 1418.
A nomeação do infante para tão importante foi ainda uma recompensa com que el rei D João I quis galardoar os serviços relevantes que seu intrépido filho prestara na expugnação da cidade de Ceuta.
Investido no governo da ordem de Cristo, passou D. Henrique a residir por algum tempo no castelo de Tomar, onde fundou para sua habitação uns Paços, que ainda existem, posto que arruinados, e conhecidos ao presente pela denominação de paço da rainha D. Catarina, em razão de ter nele residido por vezes esta excelente princesa, mulher del rei D. João III.
Durante a sua longa administração, o infante D. Henrique fez importantes obras no convento de Tomar, entre as quais avultam dois claustros, um sobretudo mais sumptuoso e mais belo, que ainda hoje é conhecido pelo nome do fundador. Todavia, essas obras materiais são um insignificante padrão da sua memoria, comparadas com os grandiosos cometimentos que o imortalizaram, ilustrando e dando celebridade ao mesmo tempo á ordem de cavalaria que teve a fortuna de o ter por chefe.
Ao cabo de algum tempo, que não excedeu a três anos, consagrado a melhorar o governo da ordem e reconstruir e ampliar os seus edifícios, cedendo ao amor do seu estudo predilecto, e a uma força oculta, sem dúvida a mão da Providência, que o impelia para as empresas marítimas, trocou a residência Tomar, onde o cercavam honras, poder, grandeza e fausto quase soberanos, pelo inóspito promontório, onde lançara, logo depois do seu regresso de Ceuta, os fundamentos da sua vila de Sagres. Chegado aí, tratou de se habilitar para realizar o vasto e audacioso plano que concebera. Criou escolas de matematica, de cosmografia e de navegação, erigiu um observatorio astronómico, fundou oficinas de construcão naval e chamou junto de si os homens distintos naqueles ramos dos conhecimentos humanos, que lhe foi possível atrair a Sagres, à forca de liberalidades de príncipe.
Quando viu que de todos estes esforços simultâneos começavam a aparecer os desejados frutos, deu principio ás tentativas que mais tarde se tornaram em descobrimentos importantíssimos, através do Oceano.
A maior parte dos cabedais que se despenderam para os levar a efeito; alguns dos nautas encarregados dessas árduas missões; e finalmente, as bandeiras que flutuavam em todas as embarcações enviadas ao descobrimento de novos mares e de novas terras, pertenciam á ordem de Cristo.
De tão nobre e generoso esforço somente quis o infante para si a gloria, de modo que do imenso proveito que dele resultou colheu a ordem a parte principal de envolta tambem com muita honra e fama.
El rei D. Afonso V, por caria de doação passada no ano de 1454 e confirmada por bulas do papas Nicolau V e Calisto III, concedeu à ordem de Cristo a espiritualidade das terras conquistadas e por conquistar, como se Tomar fosse, palavras formais da doação. Quer isto dizer que desde então lhe pertenceriam a jurisdição espiritual dessas terras, com todos os rendimentos que andavam anexos a semelhante poder. Por conseguinte o encargo que a doação régia cometeu á ordem de Cristo de fundar igrejas e evangelizar em todas as terras que á sua custa tivesse descoberto e fosse descobrindo, foi-lhe amplamente compensado com a vastidão de seus domínios, com as avultadas rendas que deles auferia, e com o imenso prestigio, autoridade e influencia que daí lhe provinha.
Celebrou o infante D. Henrique em Tomar o quinto capitulo geral da ordem. Por sua morte, acontecida no ano de 1460, sucedeu-lhe no governo desta milícia, com o mesmo titulo de administrador e governador, seu sobrinho e herdeiro o infante D. Fernando, filho del rei D. Duarte, irmão de D. Afonso V e pai del rei D. Manuel.
Governou este príncipe a ordem por espaço de dez anos, seguindo os exemplos e continuando no mesmo empenho do seu antecessor. A sua morte precoce, deu ocasião a um caso ainda mais singular que o que aconteceu na eleição de D. Lopo Dias de Sousa. Sendo nomeado para lhe suceder naquele cargo seu filho D. João, de mui tenra idade, a infanta D. Beatriz, sua mãe, solicitou e obteve do sumo pontífice, uma bulia que a investiu no governo da ordem de Cristo durante a menoridade de seu filho.
Por morte de D. João, 3º duque de Viseu, falecido muito novo, sucedeu-lhe no mestrado seu irmão D. Diogo, que foi 4º duque de Viseu. Este príncipe morreu na flor da idade, assassinado em Setúbal por el rei D. João II, seu primo, que o achou cúmplice no crime de conspiração contra a sua pessoa. Sucedeu-lhe na casa e no cargo de governador e administrador da ordem de Cristo seu irmão D. Manuel, duque de Beja.
Aqui principia um novo período de engrandecimento e de lustre para a ordem de Cristo. O duque de Beja pouco tardou em subir ao trono de Portugal, e a estreia do seu reinado foi como todos sabem a descoberta da Índia e do Brasil, ás quais se seguiu uma série não interrompida de descobrimentos e de conquistas. E a todas essas empresas gloriosas andou sempre associada a ordem de Cristo, porque se despendia nelas todos os rendimentos do mestrado, e porque muitos dos heróis que as conduziam levavam no peito a cruz vermelha divisa de tão esclarecida cavalaria.
Não trocou D. Manuel o governo da ordem pelo ceptro de Portugal. Conservou aquele em todo o seu reinado. Durante os trinta e sete anos que presidiu aos destinos da milícia de Jesus Cristo, residiu por vezes em Tomar, celebrou aí capítulos gerais em 1492 e 1503, em que se fizeram importantes reformas nos estatutos ou constituição da ordem, procedeu a obras de construção de muita sumptuosidade da igreja e convento da ordem, criou com a aprovação do papa Leão X, muitas comendas novas na mesma ordem para com elas recompensar os grandes serviços prestados pelos seus vassalos na dilatação do domínio português na África, na Ásia e na América, e finalmente fundou por conta da ordem, e para ficarem sujeitas á sua jurisdição, inumeraveis igrejas em todas essas terras d'além mar.
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