História de Guimarães e imagem de 1860 do antigo brasão
A CIDADE DE GUIMARÃES
Se dermos credito aos nossos antiquários, a origem de Guimarães quase que se perde na escuridão dos tempos. Alguns dão-lhe por fundadores os galos celtas e como se isto não bastasse para sua nobreza, ainda há quem lhe atribua um principio mais remoto. Deixando porém estas noticias meio fabulosas e destituídas de bons fundamentos, diremos contudo que a sua primeira fundação é anterior alguns séculos á monarquia e que teve por assento a pequena eminencia vizinha, onde vemos o castelo.
Começou a actual povoação junto a um mosteiro, que a condessa Mumadona, tia de D. Ramiro II, rei de Leão, edificou em o ano de 927. Apenas concluída a fabrica do mosteiro, que em relação ao tempo era uma obra grandiosa, no qual se acomodaram monges e freiras, vivendo com bastante largueza, pelas avultadas doações que a fundadora lhes fizera, foram-se construindo em torno do convento algumas casas para habitação de pessoas dependentes dele. Cresceram pouco a pouco estas edificações, mudando-se para este sitio os moradores da antiga vila Vimaranense, que assim veio a despovoar-se e a arruinar- se de todo, restando hoje poucos vestígios dela.
Para defesa do mosteiro, aonde Mumadona se recolhera, depois de viúva e do burgo, que já contava bom numero de habitantes, mandou a condessa fundar, a pouca distancia do mosteiro, no sitio em que outrora se erguia a vila velha, um forte castelo, cercado de altas muralhas e flanqueado de sete torres.
Neste venerando castelo, que ainda se levanta majestosamente sobre trono de rochedos, veio no fim do século seguinte assentar a sua corte, D. Henrique de Borgonha, conde de Portugal, pelo seu casamento com D. Tareja, filha de D. Afonso VI, rei de Leão e de Castela.
Aí dentro do recinto dessas toscas muralhas, que seriam hoje estreito espaço para residência de um simples governador, nasceu e criou-se o vencedor de Ourique, o primeiro rei dos portugueses.
O mosteiro da condessa Mumadona, santuário consagrado á Virgem sob a invocação de Nossa Senhora da Oliveira e venerado em todo o reino pelo milagre que deu origem á invocação, tornou se mais tarde nessa real Colegiada que desfruta honras quase de Sé.
Deu foral á nova vila o conde D. Henrique, conservando-lhe o mesmo nome da antiga, que se chamava Vimarães. Parece que a etimologia daquele nome eram as duas palavras latinas - Via maris, que se viam esculpidas numa pedra numa torre da vila velha, que na edificação do castelo ficou no centro, servindo de torre de menagem. Esta inscrição, sem duvida do tempo da dominação romana, indicava que a estrada que por ali passava conduzia à costa do mar. Da inscrição pois proveio á terra o nome de Vimaranes ou Vimarães, que ao diante se corrompeu no de Guimarães, Pela mesma razão se denominava quinta de Vimarães a propriedade em que Mumadona erigiu o seu mosteiro,
Por morte do conde D. Henrique, continuou seu filho, o príncipe D. Afonso Henriques, a residir em Guimarães, aonde o veio cercar, no ano de 1130, seu primo D. Afonso VII, rei de Leão e Castela, por aquele se querer eximir de lhe render vassalagem. Foi este cerco que deu lugar á memorável acção de D. Egas Moniz em que este tão esforçado cavaleiro quão dedicado aio do jovem príncipe, tendo conseguido de D. Afonso VII o levantamento do sitio, sob promessas que ao depois se não cumpriram, apresentou-se em Toledo, perante o monarca castelhano, com sua mulher e filhos, todos vestidos de alva e com baraço ao pescoço, oferecendo assim a sua vida e a de sua família pela palavra não cumprida. Afonso VII soube corresponder com generoso perdão a tamanho rasgo de lealdade e nobreza de carácter, tanto mais digno de admiração por ser praticado numa época em que os próprios príncipes faziam ostentação de falta de cumprimento das suas mais solenes promessas.
As gloriosas empresas de D. Afonso Henriques contra os sarracenos, dilatando de ano para ano os limites da nascente monarquia, fizeram perder á vila de Guimarães a prerogativa de corte, que se mudou com grande prejuízo seu para a cidade de Coimbra, mais central em relação às novas conquistas, que se tinham estendido pela Estremadura e Alentejo até ao Algarve. Porém do que a vila perdeu com a saída da corte, não tardou a ser compensada com a grande afluência de peregrinos e romeiros quem vendo-se desafrontados do maior perigo das correrias dos moiros, vinham de longes terras venerar a sagrada e milagrosa imagem de Nossa Senhora da Oliveira.
Nesses primeiros séculos da monarquia, em que as guerras absorviam todas as atenções e em que as armas constituíam, por assim dizer, o único exercício nobre e honroso, a vila de Guimarães engrandecia-se á sombra do santuário, cujos milagres ecoavam de um a outro extremo do reino, vindo aqui estabelecer-se muitas famílias nobres e varias ordens religiosas. E quando Portugal, já grande e temido pelas suas vitorias e conquistas, começou a colher os frutos da paz, prosperou então Guimarães pelo poderoso impulso da industria. Porém, a separação do Brasil, para onde exportava a maior parte dos seus produtos fabris, ocasionou-lhe a progressiva decadência do seu comercio e da sua industria manufactora.
Nas discórdias que rebentaram entre el rei D. Dinis e seu filho, o príncipe D. Afonso e na luta travada para a independência do país, entre o mestre de Avis e D. João I de Castela, padeceu Guimarães cercos e combates. As pestes que flagelaram Portugal no século XVI, dizimaram-lhe grande parte da sua população.
No antigo regímen gozava de voto em cortes com assento no banco terceiro. A imagem da Virgem, tendo nos braços o Menino Jesus, que empunha na mão esquerda um ramo de oliveira em campo de prata, constitui o brasão de armas da antiga vila de Guimarães, há pouco elevada á categoria de cidade.
Está situada Guimarães na província do Minho, em terreno um tanto alto, próximo das faldas da serra de Santa Catarina. Dista do Porto oito léguas para o norte e três de Braga para o nascente.
Tem as seguintes paroquias: a Colegiada de Nossa Senhora da Oliveira; S Miguel do Castelo; S. Sebastião; S. Paio e Santiago. A primeira, cuja fundação primitiva pertence á condessa Mumadona, como acima dissemos, foi erigida em capela real pelo conde D. Henrique, deixando então de ser mosteiro. D. Afonso Henriques e os Reis seus sucessores, concederam-lhe muitas honras e bens e alcançaram-lhe do papa grandes privilégios, com os quais veio a ser uma das mais ricas e insignes colegiadas do reino. Compõe-se o cabido de varias dignidades e cónegos, presididos por um prelado que se intitula dom prior de Guimarães.
O templo da condessa Mumadona durou, com poucas alterações, até ao reinado del rei D. João I, que o fez demolir pelo seu estado de ruína, mandando construir o que hoje existe, o qual os cónegos modernamente deturparam, mascarando-lhe com estuques e doiraduras suas venerandas e góticas
feições.
Todavia ainda conserva muitas antigualhas de alto apreço histórico e artístico. Em frente das primeiras, poremos a pia em que S. Giraldo, arcebispo de Braga, baptizou a D. Afonso Henriques, e o oratório de prata de D. João I de Castela. tomado na batalha d Aljubarrota por D. João I de Portugal, que logo o ofereceu, com outros despojos de tão grande vitoria, a Nossa Senhora da Oliveira. Entre as segundas figuram muitos e riquíssimos vasos e alfaias, que compõem o precioso tesouro daquela insigne Colegiada.
A imagem de Nossa Senhora da Oliveira é muito antiga e, conforme a tradição, trouxe-a á Lusitânia o apostolo Santiago.
Em frente da igreja ergue- se um curioso monumento, obra do reinado de Afonso IV. É um cruzeiro de pedra, com varias imagens e ornatos de alto e baixo relevo e colocado do centro de quatro arcos goticos, que sustentam a abobada que o cobre tudo de pedra. Próximo vê-se uma oliveira cercada de grades de ferro, que recorda o milagre de Nossa Senhora e que consistiu, segundo a lenda, em que uma oliveira que para ali se transplantara em tempos remotos, secando-se, logo depois reverdeceu, assim que por ela passou a dita imagem da Virgem.
A igreja de S. Miguel do Castelo, era a matriz da vila velha. Está edificada perto do castelo. É um pequeno templo de mesquinha arquitectura que mostra mui grande antiguidade. Nele é que foi baptizado o nosso primeiro rei. A pia que serviu nesta solenidade foi transportada para a igreja de Nossa Senhora da Oliveira em 1664.
A igreja de Santiago, reconstruída em tempos modernos, dizem que fora outrora um templo gentílico dedicado a Ceres Os antiquários fundamentam esta opinião com uma inscrição que aí se achou, quando se procedeu á reedificação da igreja.
Guimarães possui muitos outros templos e capelas, conventos e estabelecimentos de caridade Mencionaremos apenas os mais importantes. A igreja da Misericordia foi fundada em 1585. Nossa Senhora da Consolação, templo moderno, de boa arquitectura, está edificado num sitio aprasivel cercado de árvores num extremo da cidade. A igreja de S. Dâmaso foi erigida em 1641, em memoria deste santo pontífice natural de Guimarães. O convento de S. Domingos, da extinta ordem dos pregadores, foi fundado em 1397 e depois reedificado. O convento de S. Francisco, de religiosos franciscanos, teve começo em 1290. O convento de Santo António, de frades capuchos, foi construído em 1644. Os templos destes conventos acham-se em bom estado e consagrados ao culto. Os conventos de freiras de Santa Clara, feito em 1561; de Santa Rosa, fundado em 1680; de Capuchas, erigido em 1681; o de Santa Teresa, construído em 1685, ainda estão ao presente habitados. Os hospitais da Misericordia, de Santo António dos Capuchos, e dos terceiros de S. Domingos e, de S. Francisco, são bem administrados. Os dois últimos, podem-se contar entre os melhores estabelecimentos deste género que há no país. Contíguos aos seus edifícios, têm os terceiros dois templos em que se fazem as festas com bastante luzimento.
Guimarães tem vários terreiro e praças, das quais a principal, por sua extensão e certa regularidade, é a praça do Toural. E ornada nas extremidades com um esbelto chafariz, feito em 1588 e com um bonito cruzeiro, levantado em 1650. As ruas, pela maior parte, são estreitas, tortuosas, mal calçadas e pouco limpas, mas vêem-se nelas muitas casas nobres de boa aparência. A casa da câmara. situada na praça em que está o templo de Nossa Senhora da Oliveira, é obra del rei D. Manuel. cujas armas e esfera armilar avultam na frente do edifício.
Possui esta cidade um teatro construído, regularmente denominado de D. Afonso Henriques.
Além dos monumentos de antiguidade já referidos, encerra os seguintes, também apreciáveis: varias torres e alguns lanços da sua cerca de muralhas, estes fabricados por el rei D. Dinis e por D. Afonso IV e aquelas por D. João I; o vasto palácio dos duques de Bragança, principiado no século XV por D. Afonso, primeiro duque de Bragança, onde se admiram duas grandes e formosas janelas góticas, que pertenciam á capela. Neste paço residiram por vezes alguns príncipes e princesas desta família. Hoje está parte em ruínas e parte servindo de quartel ao batalhão de caçadores nº 6. Infelizmente o vandalismo que tantos monumentos históricos tem destruído no nosso país, arrasou até aos alicerces as mais belas torres que o mestre de Avis edificou para defesa das portas de Guimarães.
Abastecem a cidade muitas fontes de excelente agua e de todos os géneros necessários á vida; fornece- a um mercado todos os sábados, que é sem duvida o mais importante mercado semanal de todo o reino, ao qual concorrem de muitas léguas em redor muitos gados, aves, cereais, frutas, loiças, diversas qualidades de tecidos de lã, seda, linho e algodão, ferragens, etc. Nos primeiros dias de Agosto, tem uma feira anual, porém insignificante.
Guimarães não tem passeio publico, propriamente dito, porém o jardim dos terceiros de S. Domingos e o Campo da Feira, são dois lugares de recreio muito aprasiveis. Este ultimo tem a primazia pela sua pitoresca situação, que é uma das saídas da cidade; pelo ribeiro que o corta; pela sua formosa ponte, guarnecida de estátuas, assentos e árvores; e pela colina arborizada, em que se ergue a esbelta igreja de Nossa Senhora da Consolação.
Os subúrbios são encantadores. Em nossa opinião, nenhuma outra cidade de Portugal os possui mais belos. Os palácios dos senhores condes de Arrochela e de Vila Pouca, com os seus jardins em terrados, dispostos como em trono; o Castelo do conde D. Henrique, vestido de heras e cercado de árvores; o mosteiro da Costa, da extinta ordem de S. Jerónimo, rico de memorias da rainha D. Mafalda e de D. António, prior do Crato, sentado majestosamente a meia encosta de um monte, todo coberto de arvoredos, entre os quais se admira um carvalho colossal, que conta mais de sete séculos; a serra de Santa Catarina, com seus bosques frondosos, cascatas e grutas; o ribeiro Celho, junto á cidade; e o Ave, um pouco mais distante, com suas viçosas e sombreadas margens, formam variadíssimos quadros, qual deles mais delicioso.
O termo é de grande fertilidade, pela muita abundância de águas, que por todo ele rebentam e se cruzam. Produz muitos cereais, especialmente milho, boa quantidade de legumes, de vinho, linho, algum azeite, etc. Tem óptimas pastagens em que se cria muito gado.
A população de Guimarães ascende a sete mil e trezentos habitantes, grande parte dos quais se empregam no fabrico das ferragens e dos tecidos de linho e nos curtumes de coiros.
Guimarães, finalmente, conta entre os seus filhos muitos santos, que honram o martirológio e muitos homens ilustres nas armas, nas ciências e nas artes
Por Ignacio de Vilhena Barbosa
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Pelo Censos 2011 Guimarães conta com 158 108 habitantes
Freguesias de Guimarães:
Brito, Caldelas (vila das Caldas das Taipas), Lordelo, Moreira de Cónegos, Ponte, Ronfe, São Jorge de Selho (vila de Pevidém), São Torcato (AMU), Serzedelo. Aldão, Azurém, Costa, Creixomil, Fermentões, Gondar, Mascotelos, Mesão Frio, Oliveira do Castelo, Pencelo, Polvoreira, Santiago de Candoso, São Cristóvão de Selho, São Lourenço de Selho, São Martinho de Candoso, São Paio, São Sebastião, Silvares, Urgezes, Calvos, Conde, Corvite, Gandarela, Gémeos, Guardizela, Nespereira, Pinheiro, Santa Eufémia de Prazins, Santa Maria de Airão, São Faustino, anteriormente São Faustino de Vizela, São Martinho de Sande, Serzedo, Vermil, Vila Nova de Sande, Arosa, Atães, Balazar, Barco, Castelões, Donim, Figueiredo, Gominhães, Gonça, Gondomar, Infantas, Leitões, Longos, Oleiros, Rendufe, Salvador de Briteiros, Santa Leocádia de Briteiros, Santa Maria de Souto, Santo Estêvão de Briteiros, Santo Tirso de Prazins, São Clemente de Sande, São Lourenço de Sande, São João Baptista de Airão, São Salvador de Souto, São Tomé de Abação, Tabuadelo
Não esquecer Guimarães 2012 - Capital Europeia da Cultura / European Capital of Culture
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